De ex-político ao “da brecha”: os juízes que vão decidir casos de propina a André, Reinaldo e Delcídio

De ex-político ao “da brecha”: os juízes que vão decidir casos de propina a André, Reinaldo e Delcídio Juiz Roberto Ferreira Filho já foi vice-prefeito de Paranavaí , sua terra natal. (Foto: Arquivo)

Os perfis dos titulares das Varas Criminais que vão julgar políticos afamados e encrencados com suspeitas de receberem propina da JBS mostram juiz garantista, outro que já presidiu a entidade dos magistrados e um terceiro que teve que se afastar de processo após mencionar polêmica “brecha” a réus.


A lista de políticos tem o ex-governador, derrotado na última eleição e sempre protagonista no jogo político, André Puccinelli (MDB). O ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), que assumiu a articulação do partido e se mostra bastante atuante para as eleições municipais. E, por fim, o ex-ministro Delcídio Amaral, que foi de nome estrelado do Partido dos Trabalhadores a senador cassado.


Titular da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, o juiz Roberto Ferreira Filho vai julgar o processo em que André Puccinelli foi denunciado por recebimento de R$ 25 milhões de propina da JBS. O magistrado é da ala garantista, teoria jurídica que busca garantir os direitos individuais do acusado em um processo criminal.


A classificação é recebida com orgulho, como declarou em entrevista ao jornal Campo Grande News em 2020.


“É o juiz que garante o direito da pessoa que está sendo processada. Não significa que ela vai ser absolvida, mas terá julgamento justo, seus argumentos serão ouvidos, provas nulas não serão consideradas e prisão só quando necessária. É bom chegar um dia que todos os juízes tenham esse conceito. O duro é quando falam o juiz é parceiro, vai quebrar nosso galho”.


Juiz há 21 anos, Roberto já foi o “Robertinho do PDT” e ocupou por oito meses o posto de vice-prefeito de Paranavaí, sua terra natal, no Paraná. A inserção na política derivou da atuação como advogado de sindicatos. Aprovado no concurso da magistratura em Mato Grosso do Sul, renunciou ao cargo. Ao Diário Corumbaense, numa entrevista de 2011, demonstrou ter conhecido a cruel face do mundo político: alianças questionáveis e ser escanteado.


“Fui candidato a vice-prefeito em uma aliança de partidos e nós tínhamos vários compromissos com a população. Para dar um exemplo, vou falar do cursinho pré-vestibular de graça para população carente. Essa era uma bandeira para ajudar o filho do trabalhador a ter as mesmas oportunidades do filho do mais abastado. Ganhando a eleição, o prefeito acabou montando sua equipe com pessoas que eram adversárias políticas e dessa nova mentalidade. Eu passei a não ter espaço nenhum na administração, de não ter gabinete, não ser chamado para reunião e nem para participar de nenhum projeto. Na verdade, acabei sendo utilizado como instrumento de voto e depois fui afastado da administração”, disse Roberto.


Em MS, atuou em Corumbá e Ladário, além de ter sido juiz eleitoral. No ano de 2011, assumiu a 2ª Vara da Infância e Juventude em Campo Grande, segmento onde tinha destacada atuação. No ano passado, já na 1ª Vara Criminal, tentou mudar de “ares”, se inscrevendo para vaga na área cível, no caso, a 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande. Mas o cargo foi para outro juiz.


De postura moderada na condução das audiências, Roberto Ferreira Filho passou por situações no mínimo inusitadas no ano de 2020 em processos da operação Omertà. Foi diante dele, numa audiência por vídeo, que Jamil Name (já falecido) ofereceu propina de até R$ 600 milhões. Noutra ocasião, Name disse que um policial, testemunha no processo, merecia morrer por ser “mentiroso e vagabundo”. O juiz reagiu de forma enérgica, levantando o tom de voz e ordenando que o microfone do réu fosse desligado.


O magistrado condenou o ex-prefeito de Campo Grande, Gilmar Olarte, a quatro anos e seis meses de prisão na operação Pecúnia.


A ação penal em que Reinado Azambuja é acusado de receber R$ 67,7 milhões de propina, também da JBS, tramita na 2ª Vara Criminal, comandada pelo juiz Eduardo Eugênio Siravegna Junior. O magistrado já foi professor de Direito, procurador do Estado e assessor de desembargador do Tribunal de Justiça. O ingresso no Poder Judiciário foi em 2004, há quase 20 anos.


Siravegna também presidiu a Amamsul (Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul) e foi a voz a falar em nome dos colegas em momentos polêmicos. Como o pagamento de benefício aos juízes por “acervo processual”, uma forma de “engordar” a remuneração dos magistrados, e quando juíza mandou prender advogado por desacato, situação que tensionou as relações com a OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil).


Ele já atuou em Ribas do Rio Pardo, Corumbá e São Gabriel do Oeste. No ano de 2009, o juiz condenou o ex-prefeito de Ladário, José Francisco Mendes Sampaio, a devolver R$ 130.484,16 aos cofres públicos. A sentença foi por desvio de recursos do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério).


Em março deste ano, já titular da 2ª Vara Criminal, o juiz assinou a ordem de prisão contra o defensor público Helkis Clark Ghizzi, suspeito de envolvimento com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). O defensor é pai do advogado Bruno Ghizzi, preso desde o ano passado em operação sobre a atuação da “sintonia dos gravatas” a mando da facção.


Eduardo Siravegna é casado com a juíza May Melke Amaral Penteado Siravegna, titular da 4ª Vara Criminal de Campo Grande.


Outro político denunciado por recebimento de propina da JBS, no caso R$ 11 milhões, o ex-senador Delcídio Amaral, será julgado na 6ª Vara Criminal de Campo Grande, comandada pelo juiz Marcio Alexandre Wust.


Recentemente, o magistrado esteve no centro de embate com o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e, por fim, se retirou das ações da operação Courrier.


Além de considerar injusta a prisão dos advogados supostamente ligados ao PCC, o magistrado afirmou que “deixa brechas” nas decisões para que os réus consigam habeas corpus ou tranquem as decisões da justiça sul-mato-grossense no Superior Tribunal de Justiça.


Na 6ª Vara também tramita a ação penal da operação Coffee Break, em que políticos e empresários foram denunciados por articular a cassação de Alcides Bernal (PP), então prefeito de Campo Grande, com pagamento de propinas. A denúncia foi protocolada há sete anos pelo Gaeco. O processo, que inclui réus como André Puccinelli e o empresário João Amorim, corre em sigilo.


No ano passado, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) suspendeu o andamento a pedido da defesa de João Amorim, que alegou falta de fundamentação na decisão de Wust. A tese foi acolhida pelo STJ. Marcio Alexandre Wust é juiz há 22 anos.