O relatório da Agência Mundial Antidoping (Wada) que comprometeu o presidente russo Vladimir Putin trouxe também outra grave acusação: Tóquio teria comprado votos para ser escolhida sede da Olimpíada de 2020. Em seu informe publicado nesta quinta-feira, os investigadores da Wada afirmam que a cidade turca de Istambul, que concorria com a capital japonesa, perdeu os votos dos membros da Federação Internacional de Atletismo (IAAF) que fazem parte do Comitê Olímpico Internacional (COI) porque não fez um depósito de 5 milhões de dólares (20 milhões de reais) para Khalil Diack, consultor da IAAF e filho do então presidente da entidade, o senegalês Lamine Diack.
A investigação independente revelou uma dimensão inédita da corrupção e do crime nos esportes, levando a Interpol a acionar o seu alerta contra dirigentes e a abrir uma investigação mundial. "Segundo o relato da conversa, os japoneses fizeram o pagamento de tal soma. E os Jogos Olímpicos foram dados para Tóquio", indicou o informe. Os japoneses foram à final contra os turcos e ganharam por 60 votos a 36 o direito de sediar o evento que organizaram pela primeira vez em 1964.
E-mails de outro filho do dirigente da IAAF ainda apontam que ele teria "entregue pacotes" para membros do COI antes da escolha da sede dos Jogos de 2016. Doha concorria e havia estabelecido um acordo com a família Diack. Em um informe técnico, a cidade do Catar acabou se saindo melhor do que o Rio de Janeiro, mas foi desclassificada diante da proposta de realizar a Olimpíada em outubro para evitar o verão no Oriente Médio - pelo mesmo motivo, o calor intenso, a Copa do Mundo de 2022, que foi atribuída ao Catar em uma escolha que levanta suspeita de compra de votos, será realizada em dezembro e não em junho e julho como é tradicional.
O presidente da Wada, Dick Pound, explicou que não se aprofundou no caso do pagamento de Tóquio e da barganha que Diack fazia com países porque sua prioridade era lidar com o escândalo de doping que tem o atletismo russo como principal acusado. Mas deixou claro que a Interpol e os procuradores franceses abriram um processo contra Diack e estão examinando as alegações.
Hoje, dos sete patrocinadores da IAAF, quatro são japoneses: Canon, Seiko, TDK e Toyota. A suspeita é de que o dirigente trocava patrocínios por apoio aos eventos internacionais. Diack também estaria envolvido em escolhas de sedes para o Campeonato Mundial de atletismo e, até 2015, manteve um contrato com a IAAF como consultor. Desde 2007 ele tinha autorização para buscar parceiros comerciais em diversos países, entre eles o Brasil.
Acordo - A compra de eventos faz parte das investigações e, segundo os auditores, a escolha das cidades que receberiam as competições coincide com contratos assinados entre a IAAF e empresas desses países. A Coreia do Sul recebeu o Mundial de Atletismo em 2011, ano em que a Samsung assinou contrato com a federação. Em 2013, a história se repetiu: foi Moscou foi escolhida e o banco russo VTB colocou dinheiro na IAAF. Em 2015, o evento foi para Pequim amarrado a um contrato da empresa Sinopec com a entidade. Em 2021, o Mundial será disputado em Eugene, cidade americana onde fica a sede da Nike.
O Comitê Olímpico Internacional espera ter acesso aos e-mails com as conversas entre Doha e Diack. mas já indicou estar disposta a trabalhar ao lado da nova direção da IAAF (o presidente agora é o ex-atleta britânico Sebastian Coe, que organizou os Jogos Olímpicos de Londres em 2012) para examinar todo o conteúdo do informe.
O COI também diz que tomará "todas as ações necessárias" para proteger o esporte da corrupção. Diack era um membro do COI e foi suspenso da entidade apenas em novembro de 2015. Nos anos 90, o COI foi tomado por um escândalo quando foi revelado que a escolha de Salt Lake City, nos Estados Unidos, para sediar os Jogos de Inverno havia sido alvo de compra e trocas de votos. A entidade foi obrigada a passar por uma profunda reforma para combater a corrupção e limpar a sua imagem.
(com Estadão Conteúdo)
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