A cerimônia de abertura do Judiciário em 2016 colocou lado a lado dois personagens que nos últimos meses se tornaram ruidosos desafetos: o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, responsável pelos pedidos de investigação e afastamento contra o peemedebista. Ao discursar, Janot nem sequer citou o nome de Eduardo Cunha no cumprimento às autoridades na tribuna - e disparou, de forma velada, contra as críticas que o deputado tem feito à sua ação à frente do Ministério Público. "O que é público é de todos, não é e não pode ser de alguém. Ao Ministério Público cumpre a percepção e a tutela de bens e direitos conferidos a cada um dos cidadãos. Por natureza, não compactuamos ou tergiversamos com ilícito, com autoritarismo, com interesse velado. Buscamos simples e de forma clara e objetiva a verdade dos fatos e não de factoides e o seu enquadramento jurídico, sem cortinas de fumaça", afirmou Janot.
O chefe do MP prosseguiu: "A atuação ministerial sempre se pautará pela impessoalidade, apartidarismo,tecnicismo e pela estrita observância dos direitos e garantias individuais e em especial daqueles que chamados à Justiça devem responder por seus atos."
No pronunciamento, o procurador fez referências às declarações feitas por Cunha após as ações do Ministério Público contra o deputado, alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal pelo envolvimento no esquema de corrupção da Petrobras. O presidente da Câmara tem dito, repetidas vezes, que é "escolhido" para ser investigado por Janot e afirma que o procurador tem atuado ao lado do governo. No dia em que o MP pediu seu afastamento do mandato, por exemplo, Cunha declarou que Janot tentava criar uma "cortina de fumaça" e um fato político para desviar a atenção do julgamento no STF que tratava sobre o impeachment de Dilma Rousseff.
"Enganam-se de forma propositada e interpretam de forma distorcida aqueles que questionam o nosso cerne. Da mesma forma que elementos podem conduzir nossa atuação ao oferecimento de denúncia, igualmente leva-nos a requerer o arquivamento. Autonomia e a imparcialidade da Justiça e do Ministério Público opõem-se a qualquer tipo de autoritarismo de caráter politico, ideológico ou econômico. Nosso compromisso é com o estado democrático e de direito", continuou Janot.
Diante do constrangimento, ao fim do pronunciamento de Janot, o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, perguntou se algum dos presentes à mesa gostaria de fazer o uso da palavra. Cunha não se manifestou. Havia a previsão de que ele falasse à imprensa após a cerimônia. O presidente da Câmara, no entanto, deixou a corte sem dar entrevistas.
Ao iniciar o discurso, o procurador fez um balanço da Operação Lava Jato: foram 1.016 procedimentos instaurados, 396 buscas e apreensões realizadas, 119 mandados de prisão e 86 pedidos de cooperação internacional. Janot destacou ainda que foram firmados quarenta acordos de colaboração premiada, cinco de leniência e ajuizadas 36 acusações criminais contra 179 pessoas. Ele disse ainda que até o momento os valores envolvem o pagamento de 6,4 bilhões de reais em propina, dos quais 2,8 bilhões foram recuperados por meio de acordos de colaboração e 659 milhões foram objeto de repatriação. Ao todo, 2,4 bilhões de reais em bens dos réus foram bloqueados.
Também participou da cerimônia desta segunda-feira o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que, assim como Cunha, é alvo de inquérito no STF e pode ter o futuro político decidido pela corte ainda neste ano. A presidente Dilma Rousseff não compareceu, mas foi representada pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
(Fonte: Veja.com)
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