A comissão especial do impeachment realizou uma sessão histórica nesta sexta-feira e adentrou a madrugada de sábado - algo pouco usual - com discursos majoritariamente favoráveis ao afastamento da presidente Dilma Rousseff, num Congresso Nacional praticamente deserto. Dos 116 inscritos para debater o voto desfavorável a Dilma do relator Jovair Arantes (PTB-GO), vinte parlamentares se posicionaram contra o impedimento e quarenta a favor, o dobro. Um ficou indeciso. A votação final ocorrerá na noite de segunda-feira, e a tendência é que o colegiado dê aval ao afastamento da presidente, que ainda precisará ser confirmado no plenário da Câmara e no Senado Federal.
Ao todo, 61 deputados fizeram uso da palavra entre a tarde de sexta-feira e a madrugada de sábado. A reunião durou mais de 13 horas. Na segunda-feira, os 27 líderes partidários ainda poderão discursar, além do relator e do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, defensor da presidente.
Em meio aos debates, os parlamentares da base governista começaram a abandonar o plenário. Coube a um dos vice-líderes do governo reconhecer a expectativa de derrota do Planalto na comissão. "Aqui na comissão nós já perdemos. Pode ganhar aqui, não estou nem ligando. Será uma ilusão. Vocês não vão colocar 342 votos no painel no plenário no domingo", disse Silvio Costa (PTdoB-PE).
O parlamentar calcula que a base governista terá entre 29 e 31 votos dos 65 na comissão e não conseguirá enterrar o avanço do relatório favorável ao afastamento de Dilma. A principal arma do Planalto é capturar, por meio do fisiologismo, votos de parlamentares do baixo clero no plenário. E Silvio Costa tem sido um dos principais articuladores de votos pró-Dilma.
O líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), manteve o posicionamento anunciado antes e defendeu a presidente Dilma. Picciani ponderou que os juristas que ajuizaram a denúncia fizeram discursos políticos na comissão e que não encontrou na denúncia fundamentos jurídicos de que Dilma praticou crime de responsabilidade ao editar decretos de crédito suplementar e atrasar repasses a bancos públicos, as pedaladas fiscais. "Tenho convicção de que ela não cometeu. Seria aceitável por qualquer outra razão que a estabilidade republicana do presidencialismo pátrio fosse rompida? Se há dúvida que ela cometeu crime de responsabilidade, devemos ir adiante? A meu juízo isso é um erro", questionou Picciani.
O peemedebista fez o último discurso governista, por volta às 2h42 da madrugada. Daí em diante, a comissão virou um monólogo pró-impeachment, com críticas ao saldão de cargos, emendas parlamentares e ministérios promovido pelo Planalto, como informa a edição de VEJA deste fim de semana.
"Dilma usa o governo para dar guarida aos que podem ser presos", disse Bruno Covas (PSDB-SP), logo após ler no plenário a transcrição grampo telefônico em que a presidente adianta o termo de posse do ex-presidente Lula na Casa Civil, para blindá-lo de um pedido de prisão preventiva. "O golpe real foi ter mentido para a população nas eleições de 2014, tentar calar a imprensa, o Ministério Público e o Judiciário. Esse golpe não passará, impeachment já."
"O Brasil não tem jeito enquanto a presidente Dilma continuar no poder", disse Mendonça Filho (DEM-PE). Ele afirmou que "quem comanda o país é o ex-presidente Lula, de um hotel em Brasília". "Alguns se veem intimidados pela pressão do governo, alguns são cantados para que desviem da rota do interesse público com mecanismos aéticos, troca de cargos, oferta até do Ministério da Saúde para conquistar a toco custo a permanência no poder."
"A melhor alternativa para o Brasil é que o vice-presidente Michel Temer possa fazer essa transição", disse Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Indecisos - A reunião também evidenciou que ainda há votos em jogo. Inicialmente inscrito para falar tanto contra quanto a favor, o deputado Bebeto (PSB-BA) usou a palavra em defesa da presidente, mas afirmou que só definirá sua posição na segunda-feira. Ele criticou industriais favoráveis ao impeachment e se mostrou reticente em relação ao governo que poderá emergir do impeachment, liderado pelo PMDB. O pessebista disse que o processo de afastamento é muito influenciado por questões políticas, como Operação Lava Jato e a crise econômica.
Em conversa com o site de VEJA, Bebeto admitiu que não se convenceu de que as condutas de Dilma caracterizam crime de responsabilidade e deu sinais de que deve votar contra o impeachment, se o partido liberar o voto. "Em dúvida, a favor do réu", afirmou. Ele deu sinais de que discorda da posição da bancada do PSB, que indicou apoio ao impeachment. Bebeto argumentou, porém, que a orientação não deve ser necessariamente seguida e que a Executiva Nacional deverá se manifestar sobre uma posição fechada na segunda-feira. Se o comando do partido adotar posição unitária, ele afirma que seguirá.
Defesa - Houve três votos em separado, alternativos ao do relator. Todos pretendem barrar a denúncia por crime de responsabilidade contra Dilma. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que vota em separado porque o impeachment "não tem justa causa". O petista criticou a debandada do PMDB da base do governo, liderada pelo vice-presidente Michel Temer: "Temer se apressou e com seu staff, Eliseu Padilha e Moreira Franco, apresentou um programa que não ganharia a eleição, coligado a forças derrotadas".
O Líder do PDT, Weverton Rocha (MA), reproduz o argumento palaciano do "golpe de Estado" e diz que as acusações são "desprovidas de gravidade extrema, incapazes de atingir os alicerces centrais da ordem jurídica democrática" e "poderiam resultar em abalos à estabilidade institucional".
O terceiro relatório alternativo é do PSOL. O partido acusa o processo contra Dilma tem "defeitos congênitos" e repete um discurso oficial da defesa dilmista, que alega "vingança" do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que é réu na Operação Lava Jato e responde a processo no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar.
(Fonte: Veja.com)
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