O ex-presidente da Fifa Joseph Blatter ironizou nesta sexta-feira a situação da presidência da CBF - que voltou às mãos de Marco Polo Del Nero na semana passada - e disse que as federações nacionais já deveriam ter passado por reformas. Suspenso de qualquer atividade ligada ao futebol por suspeitas de corrupção, Blatter insistiu que nunca teve conhecimento dos atos ilícitos praticados na entidade e culpou "dirigentes das Américas" pelo escândalo que abalou a Fifa.
Blatter foi convidado pela Universidade da Basileia, na Suíça, para debater a crise da Fifa com acadêmicos, estudantes e jornalistas. Questionado sobre o fato de a CBF ainda ser presidida por Del Nero, um dos cartolas indiciados nos Estados Unidos, Blatter foi irônico. "Quem é mesmo o presidente da CBF?", perguntou, sorrindo. Ao ouvir o nome de Del Nero, ele apenas brincou. "Ele é o presidente?". Depois, já em um tom sério, indicou que "a Justiça fará seu trabalho".
O dirigente suíço de 80 anos preferiu não responder sobre o papel de Ricardo Teixeira e José Maria Marin, os ex-presidentes da CBF, nos escândalos envolvendo o futebol brasileiro. "Os tribunais dirão. Não tenho como controlá-los moralmente", disse Blatter. Ele, no entanto, disse que a CBF e todas as outras federações devem passar por reformas, com adoção de ficha limpa e um comitê de ética independente.
"A federação brasileira é uma das maiores do mundo. Eles precisam fazer essa reforma. Todos aqueles que foram presos em Zurique eram do continente americano. As acusações apontam para a corrupção em suas confederações. Se uma entidade não é capaz de limpar sua casa, alguém tem de entrar. O FBI e a intervenção americana ocorreram a partir das Américas", insistiu Blatter.
Blatter ignorou o fato de dirigentes europeus terem sido suspensos pela Fifa por suspeita de corrupção - como ele próprio, o seu ex-braço-direito Michel Platini e o ex-secretário-geral da Uefa Jérôme Valcke - e insistiu em culpar as federações americanas por todas as irregularidades. "Todos os indiciados são das Américas. E os supostos crimes ocorreram lá. Por enquanto, não existem europeus, asiáticos ou africanos envolvidos", disse, citando apenas os casos investigados pelo FBI.
Protestos - A primeira aparição pública de Blatter em vários meses foi marcada por momentos de tensão, protestos e acusações. Durante duas horas, o dirigente suíço que presidiu a Fifa de 1998 a 2015, contou histórias, filosofou, fez piadas e chamou de "vergonhosa" sua suspensão da Fifa. "Eu também estou lutando contra corrupção. Mas fui impedido de fazer meu trabalho", afirmou o ex-dirigente.
Minutos depois de começa a falar, Blatter foi interrompido por manifestantes que, aos berros, foram retirados do local. Em outro trecho, um grupo identificado como "associação marxista" acusou a Universidade de ter "trazido um criminoso para falar".
Blatter defendeu a Fifa sobre a escolha das sedes das Copas. "As Copas não são decididas pela Fifa. Na maioria das vezes, são decididas por pressão dos diferentes governos." Segundo Blatter, o que fez o Catar ser escolhido como sede do Mundial de 2022 foi a decisão do ex-presidente da França, Nicolas Sarkozy, de fechar um acordo com o emirado e sugerir a Michel Platini, então presidente da Uefa, que votasse pelo Oriente Médio. "Se não fosse isso, a Copa teria sido nos Estados Unidos".
O evento ainda terminou com um momento de tensão. Luis Ocampo, um ex-procurador da ONU que investigou genocídios na África e violações de direitos humanos, concluiu os debates indicando que Blatter, mesmo sem ter sido acusado formalmente de corrupção, teria de ser responsabilizado pelo silêncio que manteve por anos diante dos esquemas que ocorriam com seus membros.
"É inaceitável que Ocampo diga isso", respondeu Blatter, irritado após passar duas horas dando sua versão dos fatos.Blatter foi suspenso pelo Comitê de Ética da Fifa por oito anos, junto com Michel Platini, por "abuso de poder". Blatter é acusado pela Fifa de ter feito um pagamento suspeito ao ex-jogador francês, no valor de 2 milhões de francos suíços (cerca de 8 milhões de reais).
A transferência foi feita em 2011 e se refere, segundo Platini e Blatter, a salários relativos ao trabalho do francês como consultor da Fifa entre os anos de 1998 e 2002. As suspeitas do Comitê de Ética são de que Platini teria recebido o valor para não concorrer com Blatter nas eleições presidenciais de 2011, hipótese que o ex-jogador nega. Os investigadores, porém, alertam que o caso ainda implicaria numa falsificação do balanço financeiro da Fifa, que jamais incluiu o valor em seus informes.
(com Estadão Conteúdo)
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