Afastado do mandato e da presidência da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) compareceu à Casa nesta quinta-feira para apresentar sua defesa ao Conselho de Ética. Na sessão, Cunha repetiu o roteiro já protagonizado desde novembro, quando o processo por quebra de decoro foi instaurado: dedicou-se a atacar os procedimentos do conselho, a rechaçar as acusações de realização de manobras que levam a sua ação a ser a mais demorada da história da Câmara e a negar a manutenção de contas no exterior, que, conforme as investigações da Lava Jato, abrigaram dinheiro sujo do petrolão. "Os investimentos e os patrimônios não me pertenciam. Essa á a realidade. Eu não possuo investimentos e não há como haver prova de que eu possua", afirmou.
Cunha, que é réu no Supremo Tribunal Federal por corrupção e lavagem de dinheiro, passou a ser alvo do Conselho de Ética após PSOL e Rede ingressarem com ação pedindo a perda do mandato por quebra de decoro parlamentar alegando que ele não prestou esclarecimentos sobre as suas contas bancárias secretas mantidas na Suíça. Pior: mentiu durante depoimento à CPI da Petrobras justamente por ter negado possuir contas no exterior. Aos membros do conselho, Cunha reiterou a declaração feita à comissão de inquérito e disse apenas ser ligado a um trust ao qual não tem titularidade e tampouco pode movimentar ou dispor de bens.
"Eu não possuo investimentos. Se possuísse, certamente estariam declarados. O que eu possuo é como beneficiário de um trust. O trust é o detentor do patrimônio dos investimentos se por ventura existirem, do resultado e da perda do investimento", disse. "Nada é mais transparente do que um trust. Nele, você identifica quem é o beneficiário, a administração, quem é o responsável pela gestão", continuou Eduardo Cunha.
O presidente afastado ainda ponderou que os recursos dos trusts são advindos de rendimentos da década de 1980, quando exercia atividade de comércio exterior e, que à época à época não tinha vida pública. Ele mostrou aos membros do conselho passaporte que demonstra a entrada dele em países onde mantinha negócios e negou a ilegalidade do dinheiro. "Os recursos não são objetos de fruto de qualquer vantagem indevida", disse.
Ainda que negue a manutenção de contas no exterior, Cunha admitiu que a sua mulher, Claudia Cruz, era a titular da conta. "Eu era apenas dependente de cartão de crédito efetuado pela minha esposa. A conta era dela. Ela cumpriu os requisitos do Banco Central", afirmou. "Se eu assinasse qualquer coisa e mandasse o banco fazer qualquer tipo de transferência, o banco ignoraria com a maior tranquilidade", continuou. Investigações da Lava Jato mostram uma movimentação intensa e com gastos luxuosos da família de Cunha. Ele, porém, evitou tratar das ações de Cruz e suas filhas. "Eu não posso aceitar que queiram se estender aos familiares. A minha esposa não é deputada e não está sujeita à representação no Conselho de Ética", disse.
Embora tenha tentado manter a calma, o peemedebista se irritou em alguns momentos do depoimento. Um deles, quando chegou a elevar o tom da voz e a bater na tribuna, se deu no momento em que foi questionado sobre relatos feitos pelos empresários Ricardo Pernambuco e Ricardo Pernambuco Júnior de que Cunha cobrou propina para a liberação de verbas do fundo de investimentos do FGTS para o projeto Porto Maravilha. "Eu desminto categoricamente. Eu não tenho nada a ver com nenhuma dessas contas citadas pelo Ricardo Pernambuco e desafio a provar", afirmou.
Manobras - Durante a sessão, Cunha fez questão de negar a realização de manobras para obstruir os trabalhos do conselho - um dos argumentos usados pela Procuradoria-Geral da República para pedir seu afastamento do cargo. Ele apontou para um "jogo político que a todo momento acontece" e afirmou que diversas nulidades foram cometidas ao longo do processo, o que motivou a sequência de recursos apresentada por ele e seus aliados. "Eu não tenho nenhum interesse com a prorrogação desse processo. Tenho interesse que ele ande com a celeridade e justiça e que me permita que o julgamento seja feito dentro dos parâmetros da legalidade", disse Cunha.
O peemedebista ainda voltou a mirar contra o relator da ação, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO), e afirmou que vai contestar a sua continuidade no cargo. Isso porque Rogério, em março, deixou o PDT e migrou para o DEM, partido que fez parte do bloco de apoio à Cunha quando ele disputou a eleição pela presidência da Câmara. "Estamos diante de atos com consequências que sabemos que sua nulidade será arguida", afirmou. A sessão desta quinta reservou um espaço especial para a audiência de Cunha. Diferentemente de todas as sessões do conselho até agora, o colegiado se reúne em um dos maiores espaços da Câmara.
*Veja.com
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