O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado a mais de 23 anos de prisão pelo juiz Sergio Moro, recebeu propina de um flanco ainda desconhecido do esquema do petrolão: o pagamento de propina no setor de compras e aquisição de tubos da Petrobras. A conclusão é do Ministério Público Federal, que detalhou nesta terça-feira a 30ª fase da Operação Lava Jato, denominada Vício exatamente pela recorrência dos mesmos corruptos em esquemas criminosos.
Ao todo, as empresas Confab Tubos S/A e a Apolo Tubos e Equipamentos, que juntas tinham mais de 5 bilhões de reais em contratos com a Petrobras, pagaram valores superiores a 40 milhões de reais em propina "para prosperar" na estatal. Segundo os investigadores, no final de 2009, executivos da empresa Apolo procuraram o operador financeiro Julio Camargo, delator da Lava Jato, e pediram orientação para serem contratados pela Petrobras. Em vez de mostrarem sua qualificação técnica, os empresários falaram abertamente sobre quanto em propina precisariam desembolsar. "É uma extorsão? Não. Os próprios empresários procuraram a propina como modelo de negócio", diz o Ministério Público.
Camargo procurou o apadrinhado do PT na petroleira, Renato Duque, que abriu as portas da empresa para mais um braço de criminosos. A Apolo acabou conseguindo contratos de 462 milhões de reais e pagou 6,7 milhões de reais em dinheiro sujo, sendo pelo menos 25% àquele responsável por apadrinhar Duque, o ex-ministro José Dirceu. Além de dinheiro vivo, a propina foi viabilizada por meio de contratos fictícios orquestrados pelo irmão de Dirceu, Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, também condenado na Operação Lava Jato.
Pelo menos neste caso, o ex-diretor Renato Duque abriu mão da propina em benefício de Dirceu, embora tenham embolsado dinheiro sujo da outra empresa alvo da operação de hoje, a Confab. Ao todo, foram 9,4 milhões de dólares pagos no exterior por meio da offshore Hayley, mesma empresa que já havia sido apontada como responsável por comprar um apartamento a Duque. "É como se fosse uma teia criminosa. Passa a fazer sentido com o passar do tempo e fica mais claro quão sistêmica era a corrupção. É uma coisa que causa um certo pavor até", disse Pozzobon.
Os investigadores identificaram que, quando houve um represamento dos valores a serem pagos a Dirceu, Luiz Eduardo propôs a celebração de contratos de fachada com a empresa Credencial Construtora, Empreendimentos e Representações Ltda, velha conhecida da justiça e já citada como envolvida no pagamento de 12 milhões de reais em propina de empreiteiras enroladas no petrolão.
A Credencial, também de fachada, simulou ao longo de 2012 um contrato de 670.000 reais para que o restante da propina prometida a Dirceu pudesse ser pago. E mais: nas buscas e apreensões na casa do irmão de Dirceu feitas em etapas anteriores da Lava Jato, a Polícia Federal encontrou documentos sobre a Credencial. A empresa já tinha fechado um contrato de "consultoria" com a JD, de José Dirceu, no valor de 170.000 reais.
São vastas as evidências de que a Credencial era apenas um degrau para que a propina pudesse irrigar os cofres dos corruptos: o dinheiro que aportava na empresa era muitas vezes sacado em espécie pelos sócios imediatamente; a sede da companhia, que recebeu mais de 30 milhões de reais ao longo de cinco anos, era na casa de um dos donos, não foi contratado um funcionário sequer, a firma já se declarou como responsável por fornecimento de bens, de perfumes e só depois uma empreiteira. Nesta 30ª fase da Operação Lava Jato, foram decretadas as prisões de Eduardo Aparecido de Meira e Flavio Henrique de Oliveira Macedo, sócios da Credencial Construtora e Empreendimentos e Representações Ltda.
"A empresa era usada para lavar dinheiro por meio de contratos falsos. Os sócios (...) eram as pessoas que celebraram contratos falsos. A maior parte do dinheiro da credencial era revertida para as contas dos sócios e imediatamente sacada", disse o procurador da República Roberson Pozzobon. "O grupo de Dirceu é beneficiário de parte da propina", completou.
Uma outra frente de investigação da Lava Jato pode comprovar que José Dirceu recebeu valores ainda maiores em propina. Os indícios colhidos até agora mostram que uma terceira empresa, a Interoil Representação Ltda, repassou dinheiro ao escritório de advocacia Rocha Maia Advogados, que, por sua vez, enviou 1,2 milhão de reais para a JD Consultoria, do ex-ministro petista. "A empresa alegou representação comercial, mas foi um pagamento que não seguia a lógica de mercado", disse Pozzobon. O caso vai ser investigado pela força-tarefa da Lava Jato, já que a Interoil Representação recebeu valores da companhia V&M do Brasil, concorrente da Apolo e da Confab, já investigadas nesta fase do petrolão.
*Veja.com
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