A Netflix liberou, no dia 17 de junho, os treze episódios da quarta temporada de Orange Is the New Black, uma das séries mais populares do seu catálogo. E também a mais reassistida, pois, pela análise da audiência em mais de 190 países, a empresa descobriu que, desde a estreia, em 2013, 53% dos fãs repetiram a dose e assistiram a, no mínimo, uma temporada completa pela segunda vez - no Brasil, esse percentual é de nada desprezíveis 41% dos fãs. E o número pode aumentar, já que a nova temporada está repleta de cenas de tensão e novos confrontos entre as prisioneiras. Classificada como uma mistura de drama e comédia - o que já fez o programa cair em ambas as categorias do Emmy -, Orange guinou para o lado mais sombrio neste novo ano, e intensificou a discussão racial, que já era um dos temas centrais do seu roteiro.
A quarta temporada começa com Piper (Taylor Schilling) perdendo o controle de seu negócio de calcinhas usadas para afeitos a cheirar a underwear, já que a latina Maria Ruiz (Jessica Pimentel) resolve se tornar uma concorrente e começa a tirar "funcionárias" da loira. O trabalho, que começou com um tom de piada na temporada anterior, faz a protagonista entrar em uma disputa de território que a leva a tomar atitudes drásticas, com consequências terríveis para os dois lados.
As latinas, o grupo étnico geralmente mostrado na cozinha, ganham mais atenção. O finalzinho da terceira temporada trouxe uma grande leva de novas detentas, e estas, em sua maioria, têm a mesma origem da família de Maria, a República Dominicana, o que faz dela uma líder de uma nova gangue. A personagem Blanca (Laurá Gomez) se torna a braço-direito de Maria e começa a ter mais força na trama. Ambas ganham episódios com flashbacks mostrando sua vida pregressa, como outra latina, Maritza Ramos (Diane Guerrero), e assim saem um pouco do fundo do cenário para ganhar o mesmo destaque de outros grandes nomes da trama.
O microcosmo da prisão se mostra atualizado, principalmente com a realidade dos Estados Unidos, onde a discussão étnica e racial está em destaque devido à campanha de Donald Trump, um forte defensor de políticas de restrição à imigração. As atrizes Elizabeth Rodrigueza e Dascha Polanco, que interpretam Aleida e Dayanara Diaz, mãe e filha, na série, deram uma entrevista ao site de VEJA em que comentam esse tópico. "A situação das latinas na série exemplifica o que se passa nos EUA, pelo menos. Os americanos acham que os latinos são todos um único povo, mas há divisões culturais", diz Elizabeth. "Quando nos unimos, nos tornamos mais fortes. Vemos isso na série. Interpretamos cinco tipos diferentes de latinas, que narram histórias com que todo mundo consegue se conectar", explica Dascha.
O grupo Black Lives Matter (Vidas Negras Importam, em tradução literal), surgido no último ano nos EUA, também ressoou na série, principalmente nos seus momentos finais, em que o grupo das negras sofre uma grande perda. Há a inclusão de uma nova personagem, uma negra muçulmana, trazendo duas minorias em um único personagem, e que inicialmente vai bater de frente com a judia Cindy (Adrienne Moore).
Diversificando as representações, surgiu Hapakuka (Jolene Purdy), uma garota havaiana. Soso (Kimiko Glenn), uma das duas poucas asiáticas do elenco, também deixou de ser apenas a garota tagarela e irritante para ganhar mais cenas e presença na trama. A discussão sobre o preconceito contra as transexuais também voltou com força. Em suas poucas participações, Sophia Burset (Laverne Cox) lança uma questão -- se não foi tratada desumanamente pela administração do presídio por ser uma mulher trans e negra.
Orange nunca teve medo de tocar no espinhoso tema do preconceito racial. Nesta temporada, a série ainda critica com força a ideia de supremacia e orgulho branco. Para tentar continuar no poder, Piper se envolve com um grupo de garotas, todas brancas, que possuem ideais neonazistas. Com diálogos irônicos, e fazendo as personagens antigas se afastarem da protagonista, a criadora da série, Jenji Kohan, destrói o discurso desse grupo intolerante. A própria Piper sofre consequências extremas e chocantes por se envolver com essa ideologia, mesmo sem acreditar nela.
A quarta temporada também amplia o papel de vilão dos guardas e da administração do presídio. A vida em Litchfield se tornou pior ainda com a privatização, pois a empresa que a administra só consegue enxergar números e lucro ao invés das pessoas que habitam o local. Caputo (Nick Sandow) assume uma posição paradoxal, ao mesmo tempo em que tenta fazer o que é certo, ele confia e apoia as pessoas erradas na pressão para não perder seu emprego e seu estilo de vida.
Mas uma boa ironia da temporada é que ela colocou como antagonistas personagens considerados heróis nos EUA: veteranos de guerra. Os ex-militares assumem a função de patrulhar os corredores e assim espalham o medo, a tensão e o sofrimento entre as detentas, como se estivessem Guantánamo. Com esses novos rostos, Orange intensifica aquilo que fez em todos os anos: a crítica contra o preconceito e a violência intrínsecos à sociedade americana.
https://youtu.be/MoTDPf9qbTM
*Veja.com
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