O juiz Sergio Moro, que conduz a Lava Jato na primeira instância em Curitiba, acolheu nesta terça-feira denúncia apresentada pelos procuradores da República contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tornando-o réu no âmbito da Lava Jato. Moro considerou que existem indícios suficientes para que o petista possa responder pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Lula deixou o posto mais importante da República com 83% de aprovação. Elegeu a sucessora Dilma Rousseff em 2010 em grande medida em decorrência da onda de popularidade que o cercava. Fora do Palácio do Planalto, mantinha a capilaridade política como se ainda fosse o comandante-em-chefe da República. Usava de contatos políticos para viajar em nome de empreiteiras, recolher dinheiro travestido de palestras e usufruir de benesses, como um sítio em Atibaia e a reforma de um tríplex em Guarujá. Hoje, Lula nem de longeostenta a aura de poder de outrora. A situação do petista ficou ainda mais dramática nesta terça-feira. Sem foro privilegiado, ele terá de se submeter ao crivo da 13ª Vara Federal de Curitiba, de onde Moro toca, com mãos de ferro, os processos sobre o propinoduto na Petrobras — que já resultaram em 106 condenações e em mais de 38 bilhões de reais em pedidos de ressarcimento aos cofres públicos.
Lula passa a responder formalmente por mais duas acusações do rosário de suspeitas que pairam contra ele, desta vez pela imputação de ter recebido vantagens indevidas de pelo menos três contratos bilionários da construtora OAS, lavados por meio de uma reforma de luxo em um tríplex no Guarujá. Considerado o “comandante máximo” do petrolão pelo Ministério Público Federal, o ex-presidente derrete a aura da “viva alma mais honesta” que existe e cai na vala comum dos que devem prestar contas à Justiça. Lula já é réu na Justiça Federal do Distrito Federal sob a acusação de obstruir as investigações da Lava Jato.
No despacho, Sergio Moro avalia que há elementos suficientes para aceitar a denúncia, frisando que a admissibilidade não subentende o reconhecimento de responsabilidade criminal. “Tais ressalvas são oportunas pois não olvida o julgador que, entre os acusados, encontra-se ex-Presidente da República, com o que a propositura da denúncia e o seu recebimento podem dar azo a celeumas de toda a espécie”, disse o magistrado.
“O fato de que grande parte, talvez a maior parte, do faturamento do Grupo OAS decorresse de contratos com a Petrobras, aliado ao comprovado (…) envolvimento do Grupo OAS no esquema criminoso que vitimou a Petrobras, tornam esses mesmos contratos uma provável causa e fonte dos supostos benefícios concedidos pelo Grupo OAS, sem aparente contraprestação financeira, ao ex-presidente, como o apartamento no Guarujá e o custeio do armazenamento dos bens recebidos durante o mandato presidencial, o que, em tese, pode caracterizá-los como vantagem indevida em um crime de corrupção”, afirmou o juiz em sua decisão.
Além de Lula, também passam à condição de réus a ex-primeira-dama Marisa Letícia, o amigo do petista e presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto e outras cinco pessoas. Agora eles terão de apresentar provas, elencar testemunhas e tentar desmontar a tese de que o petista foi fundador de uma “propinocracia” no país e de que o tríplex foi pago com dinheiro da Petrobras. Assim que a denúncia foi apresentada, na quarta-feira passada, reagiu: “Provem uma corrupção minha que irei a pé para a prisão”.
Segundo as investigadores da Lava Jato, o ex-presidente recebeu, apenas no caso relacionado ao tríplex, benesses de 3,7 milhões de reais “oriundas do caixa geral de propinas da OAS com o PT”. Como ele é alvo de outras apurações no petrolão, incluindo os nebulosos pagamentos por palestras, por meio da L.I.L.S. Palestras, Eventos e Participações, as vantagens indevidas devem ser confirmadas em escala exponencial. Dos cerca de 55 milhões de reais que o Instituto Lula e a L.I.L.S. receberam de empresas, mais de 30 milhões de reais foram repassados diretamente por empreiteiras enroladas com o escândalo na Petrobras. E mais: Lula, que não foi denunciado por organização criminosa pela força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, é alvo de uma investigação sobre o tema em um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).
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