Hoje, o ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL) será julgado por uma composição do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) considerada, em sua maioria, nada simpática a ele.
Os ministros do TSE decidirão se o ex-presidente deve ficar inelegível por convocar uma reunião com embaixadores estrangeiros, meses antes das eleições, para desacreditar o sistema eleitoral brasileiro sem apresentar provas.
Em razão disso, o professor doutor da Faculdade de Direito (Fadir) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) Sandro de Oliveira disse ao Correio do Estado que vê uma forte tendência de Bolsonaro ter os direitos políticos cassados.
“De início, é preciso dizer que antecipar resultado de julgamento fica no campo da adivinhação, o que podemos fazer, como observadores, é identificar tendências de pensamento de cada um dos julgadores, já que se trata de decisão colegiada”, declarou Sandro de Oliveira. No caso do julgamento do ex-presidente, conforme Oliveira, “há uma tendência de declaração de sua inelegibilidade”. “É difícil dizer se será por unanimidade ou mesmo condicionado a se há algum elemento específico identificado no fato concreto em análise do TSE”, disse.
Sobre a noticiada proximidade do presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, com dois novos integrantes da Corte Eleitoral, o professor doutor pontuou que é difícil afirmar que haveria influência direta.
“Afinal, os dois novos membros, além de carreira sólida na advocacia, têm formação acadêmica indiscutível. Eu mesmo indico para a graduação, como bibliografia básica, o livro ‘Curso de Direito Constitucional’ do agora ministro André Ramos Tavares”, ressaltou, lembrando que ele já estava na Corte como membro suplente nomeado por Bolsonaro.
Sandro de Oliveira reforçou que, se for discutida a proximidade entre os julgadores, haveria algo a dizer sobre um julgador nomeado indicado pelo réu ao Supremo Tribunal Federal (STF).
“Deveria se dar por suspeito? Obviamente, falo do ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal. Penso que não há impedimentos ou suspeições. Ainda que tenha sido indicado pelo ex-presidente, ele passou pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça [CCJ] do Senado e foi confirmado no plenário da Casa de Leis, o que lhe conferiu legitimidade para compor o STF”, explicou.
Ele argumentou que deseja acreditar que os dois novos membros do TSE não estão à disposição do ministro Alexandre de Moraes, julgando segundo a vontade deste. “Ao contrário, os votos devem ter substância pelas características da formação jurídica de cada um deles. É preciso dizer que no meio acadêmico todos se conhecem e convivem em maior ou menor grau, isto por si só não é suficiente para colocá-los sob suspeição”, ressaltou.
Quanto ao ministro Benedito Gonçalves, conforme o professor doutor, é natural que tenha maior protagonismo no processo, em razão de ser o relator, o que ocorre em todo e qualquer processo de grande repercussão, ainda mais contra um ex-presidente da República.
“Não é de hoje que a Justiça Eleitoral vem aumentando o rigor no controle da conduta dos candidatos e dos partidos políticos, portanto, não ficaria surpreso se o TSE subir um degrau no rigor contra quem eventualmente utilize a máquina pública para benefício próprio, como é o caso, em tese, tratado na ação contra Bolsonaro. Nesse sentido, a consequência poderá ser a inelegibilidade”, projetou.
QUEM É QUEM NO TSE
> Alexandre de Moraes
Relator dos inquéritos no STF que têm Bolsonaro como alvo, tornou-se o principal algoz do ex-mandatário no Judiciário brasileiro. Doutor em Direito pela USP e professor da instituição, foi indicado para o Supremo pelo ex-presidente Michel Temer (MDB), em 2017. Antes, foi ministro da Justiça e secretário do estado de São Paulo e da prefeitura de São Paulo. É presidente do TSE e considerado como o ministro mais influente da Corte Eleitoral atualmente.
> Benedito Gonçalves
Relator da ação que pode tornar Bolsonaro inelegível, é corregedor-geral da Justiça Eleitoral e também ministro do STJ. É juiz de carreira desde 1988. Foi nomeado para o STJ pelo presidente Lula, em 2008. Até hoje, mantém uma relação próxima com o chefe do Executivo. Sonha em ser indicado pelo petista para a vaga do Supremo que abrirá em outubro com a aposentadoria compulsória da ministra Rosa Weber.
> Cármen Lúcia
Mestre em Direito pela UFMG, é ministra do Supremo desde 2006, quando foi indicada pelo presidente Lula. Segunda mulher a assumir assento na cúpula do Judiciário, contou com o apoio do então ministro Sepúlveda Pertence para ser escolhida. Votou a favor da Lava Jato e contra os interesses do PT em diversos julgamentos. Em 2021, mudou de voto para declarar a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro na condução de processos contra Lula.
> Kassio Nunes Marques
Foi indicado para o STF por Bolsonaro, em 2020, e é um dos homens mais fiéis ao ex-presidente no Judiciário. Antes, foi juiz federal do TRF1 e do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI). Quando foi indicado para o STF, estava em campanha por uma vaga no STJ. No entanto, caiu nas graças do ex-presidente e foi alçado a um dos 11 assentos da Corte. Tem mestrado pela Universidade Autônoma de Lisboa e doutorado pela Universidade de Salamanca.
> Raul Araújo
Ministro do STJ desde 2010, já foi advogado, promotor, desembargador e procurador do Ceará. Costuma adotar um viés mais conservador em julgamentos e tem mais proximidade com o campo conservador. É visto como um dos votos em favor do ex-presidente na ação. Nas eleições de 2022, deu a decisão que proibiu manifestações políticas de artistas no Lollapalooza, após Pabllo Vittar levantar uma bandeira de Lula.
> André Ramos Tavares
Ocupa um dos assentos do TSE voltado à classe dos juristas. Tem mestrado e doutorado pela PUC-SP e foi integrante da Comissão de Ética Pública da Presidência, entre 2018 e 2021. Foi nomeado ministro substituto da Corte por Bolsonaro e integrante titular do Tribunal por Lula. É visto como um homem de confiança de Alexandre de Moraes e que deve seguir a mesma linha do presidente da Corte no julgamento.
> Floriano Marques
Doutor em Direito e ex-diretor da Faculdade de Direito da USP, também ocupa uma cadeira reservada aos advogados no TSE. Chegou ao Tribunal graças ao apoio de Alexandre de Moraes. Havia uma pressão da ala feminina do PT pela nomeação de uma mulher para o cargo, mas Lula priorizou o nome dele. Assim como Tavares, a avaliação é de que deve seguir a mesma linha do presidente da Corte no julgamento de Jair Bolsonaro.