A internet via constelação de satélites da Starlink trouxe uma série de benefícios para diferentes públicos. Graças ao seu funcionamento e a instalação acessível, ela conectou locais remotos, áreas de infraestrutura precária ou pontos sem o sinal de operadoras tradicionais.
Porém, junto com essa tecnologia chegam também algumas consequências negativas do seu uso excessivo.
O jornal The New York Times contou em uma reportagem um caso curioso direto do Brasil, envolvendo uma tribo indígena da região amazônica recentemente conectada pela plataforma de Elon Musk.
O dilema dos Marubo
Moradores da Terra Indígena Vale do Javari em uma localidade com cerca de 2 mil habitantes, o povo Marubo foi diretamente afetado pela internet.
Foi principalmente com a Starlink que eles conseguiram se comunicar com serviços de emergência próximos, falar com parentes e até emitir alertas sobre questões de saúde ou ambiental.
Só que a população mais velha começou a notar também mudanças de comportamento nos usuários mais assíduos do celular. Uma das pessoas que reclamou da mudança foi Tsainama Marubo, de 73 anos.
Segundo ela, atividades culturais como pintura corporal, coleta de frutas e confecção de acessórios feitos com conchas não atraem os mais novos tanto quanto o celular.
"Os jovens ficaram preguiçosos por causa da internet. Eles estão aprendendo os caminhos das pessoas brancas. Mas, por favor, não leve a nossa internet embora", disse.
As atividades mais comuns incluem uso de redes sociais, incluindo Instagram e Kwai e conversas no WhatsApp, que estariam tirando um tempo antes passado com a família. Os relatos são muito parecidos com sociedades já conectadas em qualquer canto do mundo, impactadas pelo uso em excesso da internet.
The Marubo, an isolated Amazon tribe, connected to high-speed internet in September through Elon Musk’s Starlink. Jack Nicas, our Brazil bureau chief, visited the tribe’s remote villages to see what the internet has changed for them. https://t.co/JXwhPDcR3L pic.twitter.com/7CKCHsY4QX
— The New York Times (@nytimes) June 2, 2024
Outro problema identificado por um dos líderes da associação, Alfredo Marubo, é a pornografia. Segundo ele, jovens rapazes consomem e compartilham materiais adultos entre si pelo celular, algo antes inexistente na tribo.
Outros adultos até perceberam "comportamentos sexuais mais agressivos" de alguns meninos e suspeitam que haja influência desses conteúdos na socialização de algumas pessoas.
Starlink no Brasil: avanço e polêmicas
A Starlink começou a operar no Brasil em janeiro de 2022, após autorização da Anatel. Ela chegou na Amazônia em poucos meses, aproveitando a baixa oferta de operadoras tradicionais.
Em poucos meses, 90% municípios dos estados da Amazônia legal tinha clientes do serviço.
No caso dos Marubo, as antenas foram doadas por Allyson Reneau, uma ativista norte-americana que levou pessoalmente o material à Amazônia. Ela teve o apoio de um dos líderes da comunidade, Enoque.
"Aos críticos que acreditam que os indígenas não têm direito ao mesmo acesso à internet que as pessoas brancas, é essencial para combater ideias preconceituosas e desinformadas. (...) Os povos indígenas têm o direito de se integrar ao mundo digital, se assim desejarem, e utilizar a tecnologia para fortalecer suas comunidades e culturas. Respeitar esse direito é promover a igualdade e a justiça social", defende.
Fora o serviço para usuários interessados, a Starlink prometeu satélites para 19 mil escolas na Amazônia e foi confirmada como a fornecedora de internet para navios da Marinha brasileira.
Apesar de levar conectividade, porém, antenas da Starlink já foram encontradas até em locais de derrubada de madeira ilegal e garimpo. Nesses casos, ela é usada para rápida comunicação e até avisos sobre eventuais operações policiais.