Não é meme. Tem gente, sim, usando o ChatGPT e outras ferramentas de IA (inteligência artificial) para “fazer terapia”. Em uma busca rápida pelas redes sociais, é possível encontrar diversos relatos de pessoas que afirmam até que a IA “diz coisas que eu realmente precisava”.
Mas quem é especialista em IA explica por que isso é um risco. O doutorando Guilherme Cioccia, que estuda Ciência dos Materiais com ênfase em Inteligência Artificial pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), pontua que as IAs de produção de conteúdo apresentam viés de confirmação.
Viés de confirmação é a tendência humana que temos de buscar evidências que possam apoiar opiniões que já temos, mesmo que essa busca não seja feita de maneira totalmente consciente e proposital.
As IAs foram criadas para gerar conteúdo através do processamento de grande quantidade de dados; são chamadas de LLM, que, em inglês, significa “Large Language Models”, ou, em português, “Modelos de Linguagem Massivos”.
É assim que funciona o ChatGPT, o Gemini, DeepSeek, entre outras tecnologias de chat por IA. Como esse tipo de inteligência artificial cria conteúdos usando dados que já existem, ele tem capacidade de responder a muitas perguntas.
Por isso, é fácil responderem a perguntas com aquilo que geralmente se espera. “Assim, uma ferramenta de chat impulsionada por IA funciona processando o texto introduzido pelo usuário e gerando, de forma probabilística, uma sequência de palavras que deve fazer sentido para uma resposta útil”, explica o pesquisador, que é físico de formação e atualmente trabalha como cientista de dados.
“Isso é um indicativo de que, na imensa base de dados de treinamento, existem conteúdos de psicologia, como livros didáticos, artigos científicos, artigos em sites, comentários em blogs etc. que, de alguma forma, ela consegue estruturar e reproduzir ao usuário de forma útil”, esclarece Cioccia.
No entanto, em se tratando de questões complexas como as relações humanas e a saúde mental, as coisas não são tão simples assim. “Mas, obviamente, o papel do profissional de saúde mental vai muito além de apenas reproduzir metodologia acadêmica de forma acrítica”, completa o pesquisador.
Ou seja, por mais sentido que tenham as respostas dadas pela IA, o objetivo dessas ferramentas não é esse.
“O que eu desejo enfatizar é que esses produtos não estão sendo criados para abordar e resolver questões específicas, como a saúde mental, e, sim, para serem úteis ao usuário em uma gama de tarefas gerais”, alerta Cioccia.
Além de usarem uma base de dados já existente, sem conseguir refletir criticamente sobre isso, quais são os outros problemas de usar a IA como alternativa à psicoterapia ou em substituição à terapia com um psicólogo real?
O pesquisador começa reforçando um fator fundamental: o interesse financeiro. “Temos que sempre lembrar que esses chats impulsionados por LLMs (Modelos de Linguagem Massivos) são produtos de tecnologia com investimentos bilionários”, pontua.
E a popularização crescente dessas ferramentas garante ainda mais recursos para esses investidores. “Estamos neste momento observando uma etapa de expansão agressiva das bases de usuários, principalmente de empresas como OpenAI (ChatGPT) e Google (Gemini), caracterizada pelo baixo custo de se utilizar essas ferramentas”, completa.
O segundo fator decisivo nessa dinâmica, além da facilidade de acesso, tem a ver com o que foi pontuado no início deste texto.
“Existe outro aspecto pouco comentado: o usuário não quer usar uma plataforma em que ele não se sinta confortável. Se as respostas geradas por esses chats não forem úteis ou agradarem o usuário, ele não terá motivos para continuar usando”, aponta o pesquisador.
“Assim, é muito comum observarmos que essas ferramentas apenas buscam responder algo para o usuário, não importa se inventando informações — também chamado de alucinação — ou direcionando a resposta para algo que o usuário se sinta satisfeito em ouvir”, alerta Cioccia.
No entendimento do pesquisador, esse comportamento contrasta diretamente com o processo de terapia, “que muitas vezes não é um processo prazeroso, mas é necessário para o progresso do paciente”, avalia.
“Por fim, do ponto de vista técnico, eu ainda vejo alguns problemas: por melhor que seja uma ferramenta de IA, ela não possui persistência suficiente para armazenar e processar todo o texto introduzido pelo usuário ao simular sessões de terapia”, analisa o pesquisador.
Até porque, esse processo de saúde mental é complexo e pode levar meses, até anos.
“Acredito que o profissional de saúde mental, além de apenas ouvir o paciente, analisa todo um contexto ao qual a [tecnologia] LLM tem acesso limitado, como o jeito de falar, o tom de voz, a linguagem corporal e o ritmo das sessões, decidindo metodologias ou abordagens específicas para cada paciente”, detalha o especialista.
Essa avaliação também é feita por profissionais da Psicologia, que têm notado essa tendência de busca por esse tipo de tecnologia para atendimento psicológico, seja por curiosidade, seja por necessidade.
A psicóloga Jucimara Zacarias Martins, conselheira do CRP (Conselho Regional de Psicologia) e presidente da Comissão de Orientação e Fiscalização do órgão, pontua algumas preocupações quanto aos riscos potenciais no uso da IA como alternativa à terapia.
O vínculo é um fenômeno essencial em um atendimento psicológico. Envolve uma relação de confiança e empatia entre os participantes, auxiliando no relacionamento terapêutico.
O contato entre a pessoa atendida (seja presencial, seja pela internet) e o psicólogo é fundamental para construir uma relação permeada pela escuta ativa, por uma observação atenta, com postura empática, uma condução assertiva do profissional e adequação do método clínico diante de cada caso. “Essas são estratégias psicológicas pautadas em teorias psicológicas, raciocínio clínico e na ética profissional. Seria esse vínculo autêntico possível entre uma pessoa e uma inteligência artificial?”, questiona a conselheira.
Há uma preocupação quanto à exposição de informações pessoais em banco de dados sem que haja um controle dessas. “Consideramos que a atuação profissional da Psicologia requer cuidados quanto ao consentimento, responsabilidade profissional e sigilo”, afirma a psicóloga.
Uma aparente autoridade e exatidão da ferramenta pode levar à superconfiança do usuário nas informações da IA, induzindo ao erro e a discriminações preestabelecidas pela plataforma.
Esse tipo de resposta pode representar perigo a uma pessoa que pode apresentar, no momento, maior sensibilidade emocionalmente, interferindo em processos de tomada de decisão.
“Diante dessas preocupações acima apresentadas, e considerando que o uso de tecnologias baseadas em inteligência artificial para algumas finalidades ainda é um fenômeno recente, serão necessários mais estudos para compreender se essas estratégias são realmente funcionais e efetivas para melhorar condições psicológicas”, finaliza a conselheira.
Desde a pandemia de covid-19, atendimentos de psicologia on-line ganharam mais espaço e popularidade, facilitando o acesso das pessoas a esses serviços. De lá para cá, várias plataformas de terapia on-line, com diversos profissionais, surgiram na internet.
Listamos algumas, abaixo, com psicólogos que oferecem atendimento a partir de R$ 30 por sessão. Além de oferecer o serviço por preços bastante acessíveis, a maioria dessas páginas possibilita filtrar a busca de profissionais.
Dá para buscar por cidade onde o profissional atende, pelas áreas de conhecimento e pela especialidade que ele tem. Outros quesitos, como a faixa etária de pacientes atendida pelo psicólogo e até a abordagem terapêutica usada por ele, também podem ser escolhidos.
Com essas possibilidades de filtragem, o interessado pode até escolher psicólogos especialistas em temas específicos, como orientação vocacional, mudança de carreira, medo de dirigir, transtornos compulsivos, de humor e alimentares, estresse, dependência emocional, autoestima, ansiedade, luto, depressão, traumas e dezenas de outros temas.
PsyMeet – https://www.psymeetsocial.com – Oferece atendimentos a partir de R$ 30 por sessão;
Terappia – https://www.terappia.com.br/psi – Oferece atendimentos a partir de R$ 40 por sessão;
Psitto – https://www.psitto.com.br/ – Oferece atendimentos a partir de R$ 50 por sessão;
Unolife – https://unolife.com.br/psicologos-online/ – Oferece atendimentos a partir de R$ 79,90 por sessão.
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