A investigação, que saiu às ruas há 10 anos, fez sobrar “lama” para apurar a cassação do então prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP); esquemas em licitações no TCE (Tribunal de Contas do Estado) e venda de sentença no TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).
Na Coffee Break, que neste ano resultou na condenação de políticos e empresários por armação na cassação do mandato de Bernal, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) agiu após as gravações, obtidas com autorização judicial na Lama Asfáltica, apontarem o envolvimento de João Amorim, dono da Proteco Construções, que estava insatisfeito com o fim de contratos com a prefeitura.
A sentença histórica, do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, condenou 11 pessoas, entre empresários, um vereador, cinco ex-vereadores, dono de um jornal, ex-prefeito e procurador aposentado da Câmara Municipal, por improbidade administrativa, em virtude de um golpe para cassar Bernal.
Na decisão, o magistrado lembrou da Ultima Ratio, a mais recente das operações “nascidas” da Lama Asfáltica. Em outubro de 2024, a PF mirou suspeita de venda de sentenças no Tribunal de Justiça, com afastamento de desembargadores.
O juiz Ariovaldo atacou a tolerância inexplicável com a corrupção. “Essa corrupção é tão evidente que episódios recentes relacionados ao Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul, órgão responsável pela fiscalização da aplicação dos recursos públicos, e ao Tribunal de Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, órgão responsável pela prestação jurisdicional estadual, relacionam agentes políticos de tais órgão a supostos atos de corrupção ou improbidade, o que revela a falta de mecanismos internos de controle para o efetivo combate à corrupção e à improbidade administrativa”.
A lista de condenados tem os empresários João Amorim, João Roberto Baird, intocáveis até então, Carlos Naegele, o vereador Jamal Salem (MDB), o ex-prefeito Gilmar Olarte (sem partido), os ex-vereadores Mário César de Oliveira (MDB), Edil Albuquerque e José Airton Saraiva (Avante), o ex-deputado estadual Paulo Siufi Neto (MDB) e o procurador aposentado da Câmara, André Luiz Scaff, além do espólio do ex-vereador Alceu Bueno.
Oito anos antes da Ultima Ratio, em 2016, a Lama Asfáltica já tinha colhido indícios de corrupção no Tribunal de Justiça. No ano de 2018, a fase Computadores de Lama apreendeu um notebook que se mostrou crucial.
O computador do advogado Fábio Castro Leandro, filho do desembargador aposentado Paschoal Carmelo Leandro, levantou suspeita sobre o juiz Paulo Afonso de Oliveira, afastado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e o desembargador aposentado Júlio Roberto Siqueira Cardoso.
“Com a realização de medidas cautelares de busca e apreensão e medidas pessoais cautelares foram encontrados, fortuitamente, elementos de convicção que apontaram para o possível envolvimento do Desembargador JÚLIO ROBERTO SIQUEIRA CARDOSO e do juiz estadual PAULO AFONSO DE OLIVEIRA, titular da 2ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande, em atos supostamente qualificados como corrupção passiva, pelo fato de, possivelmente, terem recebido vantagem indevida para proferir decisões judiciais que resultaram no pagamento fraudulento de mais de cinco milhões de reais à advogada EMMANUELLE ALVES FERREIRA DA SILVA”.
A Lama Asfáltica também colheu provas que levaram a Polícia Federal ao Tribunal de Contas. Era a operação Mineração de Ouro, que começou em 2021 e contabiliza três fases.
A apuração dos crimes de peculato, corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro começou após ligações interceptadas na operação Lama Asfáltica.
Em 2025, o maior escândalo de corrupção na corte fiscal completa quatro anos sem o início do julgamento das três denúncias no Superior Tribunal de Justiça, marcado pela morosidade e com três dos sete conselheiros ainda afastados da função.
Documentos apreendidos na Lama Asfáltica levaram o GECOC (Grupo Especial de Combate à Corrupção) do MPE a deflagrar a Operação Redime, que apontou desvios de R$ 46 milhões na saúde. O MPE também apontou conexões com os escândalos na saúde em Sidrolândia, Coxim e Naviraí.