Denúncia do Ministério Público Estadual, após Operação do Gaeco e Gecoc, revelam que o prefeito de Terenos, Henrique Wankura (PSDB), teria recebido R$ 255 mil em apenas uma obra no Município.
Cruzando os dados com o valor de mercado de seus bens, o Ministério Público estima que o patrimônio do prefeito chegaria a R$ 6,14 milhões em 2024. A investigação destaca a compra de imóveis rurais com valores supostamente subfaturados.
A Fazenda Ipê Amarelo, em Aquidauana, foi declarada por R$ 1,5 milhão. Todavia, o valor de mercado de propriedades semelhantes na região indicaria um preço real de R$ 4,35 milhões, uma diferença de R$ 2,85 milhões.
A promotoria relatou diversos casos que mostram como funcionava a organização criminosa. Em uma das denúncias, o MPE detalha a tomada de Preços nº 006/2022, aberta em 27/10/2022 e julgada em 18/11/2022, para contratar empresa especializada na prestação de serviços classificados como obras ou serviços de engenharia para reforma e construção na Escola Jamic.
A empresa vencedora no contrato de R$ 2,7 milhões foi a Angico, que com aditamentos, chegou a R$ 3,3 milhões. Segundo a denúncia, em 16/03/2022, 07 meses antes da abertura da licitação debatida, o empresário já adotava providências para viabilizar o início dos trâmites licitatórios, por determinação do Prefeito Municipal.
Segundo a denúncia, em julho de 2022, pouco mais de 03 meses para a abertura da licitação, o secretário de Obras, Isaac Cardoso Bisneto, teria iniciado uma sequência de conversas com o empresário Sandro José Bortoloto, a fim de alinhamento das exigências e da necessidade de atendimento do edital sequer publicado.
No dia 16/09/2022, Sandro teria solicitado informações ao prefeito acerca dos trâmites do processo licitatório em debate, e este, por sua vez, se compromete a atualizar o empresário, após verificar as informações com o secretário de Obras. Na véspera do julgamento da licitação, 17/11/2022, o Prefeito teria encaminhado ao empresário Sandro um arquivo contendo uma lista das empresas que retiraram o Edital da Tomada de Preços 006/2022 perante a Prefeitura Municipal, com os respectivos contatos, contemplando o referido empresário com informações privilegiadas do certame.
“Contudo, em conversas captadas de 18/11/2022, Isaac diz a Sandro que as empresas que compareceram para o certame seriam só ator”, diz parte da denúncia.
Tabela com propina de R$ 255 mil
No entendimento dos promotores, na fraude à Tomada de Preço 006/2022, o prefeito teria recebido R$ 255.000,00, ou seja, aproximadamente 7,5% do valor total da obra licitada. Os números têm como base uma planilha solicitada por Sandro a seu enteado, discriminando data e valores pagos ao prefeito.
02/02/2023 – R$ 14.000,00; 09/02/2023 – R$ 9.000,00; R$ 24/03/2023 – R$ 35.000,00; 30/05/2023 – R$ 30.000,00; 27/07/2023 – R$ 17.000,00; 16/11/2023 – R$ 80.000,00 e 22/11/2023 – R$ 50.000,00, além de R$ 20.000,00 pagos após e emissão da planilha.
Os pagamentos estariam comprovados por meio da análise de conversas por whatsapp, onde consta a planilha, além de dados bancários e cruzamento de informações colhidas.
Depósito na conta da avó
A polícia identificou um repasse em 24 de março, com transferência de R$ 35 mil para a conta bancária de L. A. C., avó do secretário de Obras.
A denúncia também indica outras três transferências, de R$ 80.000,00 em 16/11/2023; de R$ 50.000,00, em 22/11/2023 e de R$ 20.000,00 em 28/02/2024. Duas delas, identificadas na citada tabela, foram realizadas por Sandro para conta da empresa Conect Sistemas Elétricos, de propriedade de Eduardo Schoier, outro investigado da suposta organização criminosa.
“A conclusão investigativa evidência que o grupo teria fraudado e direcionado a Tomada de Preços 006/2022, sob a liderança do Prefeito Henrique, e com a participação pessoal e direta do então Secretário de Obras de Terenos (Isaac), junto com os empresários Sandro e Cleberson (empresário Cleberson José Chavoni Silva), sendo que, posteriormente, teria se providenciado a contrapartida em forma de propina ao Prefeito, cujos valores foram encaminhados à empresa de Eduardo Schoier, que funcionaria como testa de ferro de Henrique”, relata a promotoria.
Os promotores ressaltam que a empresa Conect Construções, de Eduardo Schoier encontra-se situada no mesmo endereço da empresa Cerrado Ambiental, de propriedade do prefeito Henrique Budke.
Propina em Dourados
Os promotores relatam que no dia 09/09/2022 foi identificada uma nova solicitação de propina que teria sido realizada pelo Prefeito Municipal, agora, no valor de R$ 31.000,00. Na ocasião, o Prefeito se propôs a deslocar um servidor para buscar o dinheiro em Dourados/MS, enquanto Sandro. No final, o dinheiro foi retirado em Campo Grande.
“Restou alinhado que a propina seria retirada no escritório do empresário, na Rua Julio de Castilho, 3308, Sala 02, Campo Grande/MS, pela pessoa de L.C.V. Ainda no dia 15/09/2022, Henrique indaga Sandro se o motor do carro é 3.1, o que é confirmado pelo empresário, cujo valor guardaria correspondência com aquele pleiteado, qual seja, R$ 31.000,00, e nesses termos o Prefeito estaria tentando disfarçar as conversas acerca da propina”.
O MPE identificou outro pedido de propina ao empresário Sandro, em meados de 2024. Na ocasião, Sandro relata dificuldade em realizar o pagamento, porém, diante da insistência de Henrique Wancura, acaba indicando que aceitaria.
“No dia 10/06/2024, o Prefeito pede ajuda a Sandro, ocasião em que o empresário questiona se Henrique estaria na cidade no dia seguinte. Os dados bancários dos investigados teriam comprovado que no dia 11/06/2024 foi realizada uma transferência da empresa de Sandro à Conect Construções, de titularidade de Eduardo Schoier, no valor de R$ 100.000,00, este que seria a pessoa utilizada pelo Prefeito para receber propina em seu nome, atuando como ‘testa de ferro’, volta a denunciar o MPE.
O caso
Henrique Wancura Budke foi preso ontem, junto com outras oito pessoas, só em Terenos. A investigação do Gecoc e Gaeco constatou a existência de organização criminosa voltada à prática de crimes contra a Administração Pública instalada no município de Terenos/MS, com núcleos de atuação bem definidos, liderada por um agente político, que atuava como principal articulador do esquema criminoso.
“A organização criminosa se valia de servidores públicos corrompidos para fraudar o caráter competitivo de licitações públicas, direcionando os respectivos certames para beneficiar empresas participantes do esquema delituoso, mediante a elaboração de editais moldados e por meio de simulação de competição legítima, em contratos que, somente no último ano, ultrapassaram a casa dos R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), diz parte da nota do Gaeco.
Segundo as investigações, o esquema também envolvia o pagamento de propina aos agentes públicos que, em típico ato de ofício, atestavam falsamente o recebimento de produtos e de serviços, como ainda aceleravam os trâmites administrativos necessários aos pagamentos de notas fiscais decorrentes de contratos firmados entre os empresários e o poder público.
A polícia extraiu provas de alguns telefones celulares apreendidos na Operação Velatus, compartilhadas mediante autorização judicial, que revelaram o modus operandi da organização criminosa e possibilitaram que se chegasse até o líder do esquema.
“Spotless” – termo que dá nome à operação, é uma referência à necessidade de os processos de contratação por parte da Administração Pública serem realizados sem manchas ou máculas.
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