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Para juristas de MS, PEC da Blindagem deve ser declarada inconstitucional
Caso seja aprovada pelo Senado, parlamentares só poderão ser presos, mesmo que em flagrante, após votação do Congresso
18/09/2025 08h58
Por: Tribuna Popular Fonte: Correio do Estado
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta - FOTO: Câmara dos Deputados

Após manobra costurada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB) para aprovar a autorização ou não de abertura de processo criminal contra parlamentares federais, o Correio do Estado procurou os juristas Sandro Rogério Monteiro de Oliveira, André Borges e Benedicto Arthur de Figueiredo Neto para comentarem sobre a chamada PEC da Blindagem.

Eles acreditam que a referida PEC, que agora terá apenas de passar pelo Senado para começar a valer, deve ser declarada inconstitucional. 

Doutor em Direito Constitucional e professor da Faculdade de Direito (Fadir), da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Sandro de Oliveira explicou que a exigência de autorização prévia do Congresso para o prosseguimento de ações penais contra parlamentares tende a dificultar ou mesmo impedir investigações e processos, sobretudo em contextos em que haja maioria parlamentar aliada ou conivente. 

Além disso, conforme ele, o uso do voto secreto favorece a ocultação de responsabilidades, reduzindo a transparência e impedindo que a sociedade acompanhe de forma clara a postura de seus representantes. 
“Do ponto de vista constitucional, a proposta afronta cláusulas pétreas, como a separação de Poderes, o princípio da igualdade, a dignidade da pessoa humana e o devido processo legal. Ao transferir para o Legislativo a decisão sobre a possibilidade de processamento de parlamentares, limita a atuação do Poder Judiciário e enfraquece os mecanismos de freios e contrapesos”, manifestou-se.


O professor acrescentou que há uma tendência de agravar a tensão entre os Poderes Legislativo e Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal (STF), que atualmente detém competência para julgar parlamentares em determinadas hipóteses. 

“Também pode gerar descrédito das instituições democráticas, uma vez que a medida é interpretada pela população como tentativa de autoproteção por parte do Congresso”.

Sandro de Oliveira descreveu que a tramitação de processos criminais contra parlamentares corre o risco de sofrer atrasos, já que a necessidade de deliberação das casas de Leis pode funcionar como um mecanismo de engessamento. 

“Em casos de prisão em flagrante por crimes inafiançáveis, mesmo havendo previsão de análise em até 24 horas, a ausência de deliberação pode suspender a prisão, abrindo espaço para impunidade, recursos jurídicos e até mesmo fugas”, alertou.

Ainda de acordo com ele, partes da PEC podem ser questionadas no STF, sobretudo aquelas que contrariam cláusulas pétreas ou alteram a repartição de competências estabelecida na Constituição. 

“Mesmo que seja aprovada, sua efetividade dependerá de regulamentações complementares e de interpretações judiciais, o que pode limitar ou mesmo barrar seus efeitos. A PEC, se aprovada, poderá ser aplicada pelos parlamentos estaduais, blindando do mesmo modo deputados estaduais investigados”, projetou.

Já o advogado André Borges explicou ao Correio do Estado que a PEC da Blindagem é um assunto bem polêmico. “Entre os principais pontos da PEC da Blindagem, está a ampliação do foro privilegiado para beneficiar presidentes de partidos políticos, que só poderão ser processados criminalmente no STF”, apontou.

De acordo com o advogado, “as novidades se apresentam como uma forte reação às inúmeras decisões recentes do STF contra parlamentares”. 

“A Câmara dos Deputados criou mecanismo de maior proteção: processos criminais e prisões de parlamentares dependerão da prévia autorização das câmaras alta e baixa”, disse, ressaltando que, para ele, “a PEC fortalece o exercício livre e desimpedido do mandato parlamentar”.
Borges completou que “não reputo a medida exagerada, pois os parlamentares exercem função pública de alta relevância e precisam ter ampla liberdade de fala, movimentação e ações para bem defenderem os interesses públicos”. 

“Entretanto, considerando o forte ativismo atual do STF, não é de duvidar que haverá questionamento sobre a PEC, se ela for aprovada. Podendo ser derrubada por inconstitucionalidade: violação da separação dos Poderes, porque estaria havendo participação indevida do Poder Legislativo em assunto que caberia apenas ao Poder Judiciário – prisões, medidas cautelares, processos criminais”, analisou.

O jurista Benedicto Neto comentou que a PEC da Blindagem “é o avesso do que propôs o legislador constituinte originário, quando promulgou a Constituição e fez constar no preâmbulo da Carta Magna que buscaria a solução pacífica das controvérsias”.

“O acirramento dos ânimos entre os Poderes Legislativo e Judiciário deixou de ser institucional para se pessoalizar, eis que a justificativa da PEC da Blindagem tem dois personagens envolvidos em um imbróglio já conhecido: a prisão decretada monocraticamente pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF, contra o deputado federal Daniel Silveira (PL-RJ), e o estopim acaba sendo o julgamento do ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL)”, opinou.

De fato, conforme o advogado, a polarização política entre progressistas, conservadores e uma discussão polêmica sobre a imparcialidade do ministro Alexandre de Moraes está transformando a República em uma arena de gladiadores, que a cada dia mais vem destruindo a independência e a harmonia entre os Poderes.