O aumento da mistura obrigatória de etanol anidro na gasolina, aprovado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), foi anunciado como um marco na política energética do Brasil. A expectativa era de que a medida pudesse reduzir o preço final nas bombas em até R$ 0,11 por litro. Em Mato Grosso do Sul, no entanto, o efeito esperado não se confirmou.
Dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) revelam que os valores pagos pelos consumidores de MS se mantiveram praticamente estáveis nas últimas semanas.
Entre 27 de julho e 27 de setembro, o preço médio da gasolina comum oscilou de R$ 5,95 para R$ 5,94, praticamente sem alteração ou R$ 0,01. A gasolina aditivada também se manteve no mesmo patamar, passando de R$ 6,15 para R$ 6,14. O etanol hidratado, que poderia ganhar competitividade com a ampliação da mistura, registrou leve alta, saindo de R$ 3,88 para R$ 3,91 no mesmo período.
Já o diesel comum variou de R$ 5,94 para R$ 6,03 e o diesel S10, de R$ 6,00 para R$ 6,05. Ou seja, mesmo com uma mudança significativa na política de biocombustíveis, o impacto direto ao consumidor em Mato Grosso do Sul foi praticamente nulo.
O mestre em Economia Eugênio Pavão explica que essa resistência na queda dos preços segue um padrão consolidado. “O preço dos combustíveis geralmente sobe de elevador e desce de escada. Eles [empresários] muitas vezes acabam retendo essa margem, alegando que o estoque é novo”, afirma.
Segundo ele, o comportamento dos postos e das distribuidoras cria um descompasso entre as medidas anunciadas e o efeito prático no bolso do motorista.
O CNPE aprovou a elevação da mistura obrigatória de etanol anidro à gasolina para 30%, criando o que foi chamado de E30. À época da decisão, em junho, a Associação dos Produtores de Bioenergia de Mato Grosso do Sul (Biosul) se manifestou dizendo que a mudança representa “um marco histórico na consolidação da política de biocombustíveis no Brasil” e reforça a implementação da chamada Lei do Combustível do Futuro.
O aumento do porcentual de etanol na gasolina foi determinado pelo CNPE na Resolução nº 9, de 25 de junho de 2025, com validade a partir de 1º de agosto deste ano. A resolução atribuiu à ANP a responsabilidade de ajustar o parâmetro que mede a octanagem da gasolina C, conhecido como Research Octane Number (RON). É uma medida da resistência di combustível à detonação (o “bater” do motor), que indica sua estabilidade e capacidade de suportar altas taxas de compressão.
“A partir dessa atualização nas especificações, será possível garantir que os consumidores tenham acesso a um combustível com maior octanagem, benefício decorrente do novo teor de mistura E30”, disse o governo federal à época.
A proposta da ANP é de que o valor mínimo de RON da gasolina C passe de 93 para 94, assegurando a manutenção da qualidade do combustível. Isso porque combustíveis com maior octanagem proporcionam melhor desempenho e maior eficiência em motores modernos.
Estudos técnicos do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT) confirmaram a segurança e a eficiência da medida, apontando inclusive o potencial de redução imediata do preço da gasolina em até R$ 0,11 por litro. Além do aspecto econômico, a decisão fortalece a autossuficiência energética do Brasil.
Com o E30, o País reduz a necessidade de importações em mais de 700 milhões de litros por ano e corta 1,7 milhão de toneladas de emissões de CO, colaborando para o cumprimento das metas climáticas assumidas pelo Brasil em acordos internacionais.
Para Mato Grosso do Sul, o impacto é ainda mais relevante. O Estado se consolidou como polo produtor de etanol, seja a partir da cana-de-açúcar, seja a partir do milho, e ocupa posição estratégica na transição energética brasileira. A Biosul destacou que “a ampliação fortalece a indústria local, atrai investimentos, gera empregos e pode ampliar a receita tributária do Estado, reforçando o protagonismo na produção de energia limpa e na contribuição à transição energética do País”.
Apesar do peso estratégico da medida e dos benefícios projetados, para o consumidor, a percepção é de que os preços se mantêm elevados mesmo em um estado que lidera a produção de biocombustíveis.
Especialistas afirmam que os resultados da política do E30 poderão ser percebidos de forma mais clara no médio e longo prazo.
O fortalecimento da cadeia do etanol, somado à maior competitividade diante da gasolina fóssil, pode criar condições para a estabilização de preços em patamares mais baixos. Contudo, essa tendência depende do comportamento do mercado e da forma como distribuidores e revendedores vão repassar os benefícios.