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Zerar déficit de 202 mil vagas em presídios custaria R$ 14 bilhões
Em CPI, senadores citam fragilidade da inteligência sobre presídios
19/11/2025 12h34
Por: Tribuna Popular Fonte: Agência Brasil

Para zerar o déficit de vagas em presídios no Brasil seriam necessários R$ 14 bilhões para a construção de novas unidades com 202 mil vagas. O cálculo é da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP).

“[São] recursos para investimento e construção de unidades para suprir esse déficit de 200 mil vagas. E aí, por óbvio, precisaria de mais um tanto de recursos para custeio dessas unidades, porque vamos precisar de policiais penais, de contratos, pagar energia, alimentação”, destacou o diretor de inteligência da Senappen Antônio Glautter.

O diretor da Senappen foi ouvido nesta quarta-feira (19) pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que investiga o crime organizado, criada após a repercussão da operação policial no Rio de Janeiro que matou 121 pessoas.

Ao todo, o Brasil tem 702 mil pessoas privadas de liberdade, em 1.375 unidades prisionais, que somam um déficit de 40% de vagas . É a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos (EUA) e da China.

A nível de comparação, o valor de R$ 14 bilhões para a construção de presídios se aproxima dos R$ 12 bilhões que a Polícia Federal (PF) estima que foram desviados na suposta fraude do Banco Master revelada nesta terça-feira .

O relator da CPI, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), ponderou que o Congresso Nacional tem aumentado penas contra os mais diversos crimes, o que levará a um aumento do encarceramento no Brasil.

“É preciso fazer o passo seguinte. [Essa política de aumento do encarceramento] Tem um custo, e esse custo não é pequeno. Nós temos uma decisão política tomada que vai levar a um aumento de encarceramento”, disse o relator.

Vieira tem defendido que a CPI defina de onde sairão os recursos para custear a segurança pública no Brasil.

Ontem, a Câmara aprovou o Projeto de Lei (PL) Antifacção , que aumenta penas para membros de facção criminosas para 20 a 40 anos de prisão, com ao menos 85% da pena cumprida em regime fechado.

As facções no Brasil

O diretor Antônio Glautter informou ainda à CPI que a inteligência da secretaria de políticas penais calcula que existem hoje no Brasil 90 facções criminosas, sendo duas com atuação internacional, 14 com atuação regional e 74 com abrangência apenas local.

A forma de distribuição desses presos faccionados nas penitenciárias é desigual, muda de estado para estado. Algumas unidades da federação, como Espírito Santo (ES) e Goiás (GO), não fazem qualquer separação entre os membros de facções e outros presos.

“A regra nos estados é separar os presos por facção. Temos algumas exceções. O estado do Espírito Santo, por exemplo, é um estado que não faz divisão. O preso comum fica alocado com o preso faccionado”, disse Glautter.

Falta de dados

Senadores reclamaram da fragilidade nos dados da inteligência sobre os presídios brasileiros e, em especial, de estudos que indiquem qual a melhor forma de alocar os presos de facções, como destacou o presidente da Comissão, senador Fabiano Contarato (PT-ES).

“Nós não temos dados de qual é o impacto se você separa os presos por facção ou não separa por facção. Nós não temos dados de que o percentual de reincidência ou dessa interlocução entre os presídios".

"Um Estado que não tem informação e não tem dados é um Estado com os olhos vedados. É um Estado que está tateando, cego. Então, como que você fala em política penitenciária?”, questionou Contarato.

Para o relator, Alessandro Vieira, o trabalho de inteligência em presídios “ainda está no início”.

“Existe uma dedicação, um esforço, mas nós não temos os dados que a gente entende serem fundamentais para uma boa gestão do sistema. A gente vai, ao longo da CPI, buscar esses dados e buscar também como fortalecer a instituição para que ela tenha, naturalmente, esse tipo de informação”, explicou à Agência Brasil .

Problema histórico

O diretor de inteligência da Secretaria Nacional de Políticas Penais afirmou que o trabalho dele é interligar as inteligências de todos os estados, mas reclamou da alta rotatividade entre os responsáveis pela inteligência nas unidades da federação .

"Temos um problema, na Inteligência Penal, de uma rotatividade considerável. E, daí, a importância de sempre ter os pontos focais nos estados e dos eventos de integração, para que essas pessoas se conheçam, porque, embora seja [um trabalho] institucional, mas o conhecer é muito importante, o networking é muito importante", disse Antônio Glautter.

Glautter avaliou ainda, na CPI, que o problema do sistema penitenciário brasileiro é estrutural e histórico, atravessando todos os governos há décadas.

“A questão prisional brasileira é uma questão com problemas históricos, problemas orgânicos, problemas que não são desde o governo anterior, mas de longa data”, avaliou.

Glautter lembrou que as duas principais facções criminosas do Brasil, Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital (PCC), nasceram dentro dos presídios no Rio de Janeiro e em São Paulo , contra o Estado, tendo em vista os massacres e torturas dentro das penitenciárias.

“Uma, na década de 70, no Rio de Janeiro [Comando Vermelho], e a outra, na década de 90, em São Paulo [PCC]. Foi um ambiente propício, ali, para que esses presos se associassem e se unissem. E essas uniões, que ocorreram, inicialmente, ali, no momento de prisional, tomaram as ruas, e, hoje, a gente tem esse problema, que, como digo, surgiu no ambiente prisional, dentro desse contexto histórico”, afirmou.