Com 40 famílias transferidas da Cidade de Deus para o bairro Vespasiano Martins – região sul de Campo Grande – até o meio da tarde de ontem (9), a Prefeitura da Capital descartou a antiga previsão de três dias para concluir a mudança da favela para áreas pública em três bairros e já prevê ao menos uma semana para levar as 390 famílias. Mas, caso o trabalho se mantenha no mesmo ritmo dos três primeiros dias, remoção de em média 13 famílias por dia, a Emha (Agência Municipal de Habitação) só concluirá a ação em um mês.
Ainda conforme a prefeitura, há previsão de que a partir de hoje comece a transferência dos barracos escolhidos para serem levadas aos outros dois terrenos reservados na região sul da cidade. A localização exata ainda não foi divulgada por questão de segurança, pois há o risco de invasão antes que as famílias cheguem.
Moradores levadas para Vespasiano reclamam de perigo no trajeto das crianças para escola
Como o bairro Vespasiano Martins fica próximo do Dom Antônio Barbosa, as crianças que mudaram de “endereço” devem continuar estudando na Escola Municipal Padre Tomaz Ghirardelli. O problema é que agora os alunos encaram um trajeto de cerca de 2 km, pela rua Lúcia dos Santos, onde não há calçada em boa parte do caminho.
“É um perigo! As crianças pequenas andando na beira da rua, porque não tem calçada. Antes, eles desciam da favela pela avenida Evelina Selingardi, onde passa ônibus e tem calçada”, contou a diarista Ramona Ximenes, 34, que no meio da manhã já estava preocupada com a volta do filho da escola.
Além disso, mesmo com padrão de luz e hidrômetro regularizando o abastecimento de energia elétrica e água, as ligações nos barracos continuam improvisadas e podendo resultar em acidentes. A administração municipal até está ajudando na montagem dos barracos, mas não a fazer as ligações elétricas e hidráulicas. “Eles [Energisa e Água Guariroba] instalaram tudo, mas nós que temos que arrumar o fio e ligar no barraco. E a água também, nós que temos que puxar do hidrômetro”, explicou a dona de casa Rosângela Ximenes, 30. A área, loteada pela prefeitura que dará autorização de uso dos terrenos para os moradores, tornou-se uma nova favela com fios remendados, como eram os “gatos” da Cidade de Deus.
De acordo com a Águas Guariroba, concessionária responsável pelo abastecimento de água da Capital, a responsabilidade da empresa é apenas em realizar a ligação até o cavalete. “A instalação do terreno para dentro compete ao morador”, disse por e-mail. Já a Energisa foi procurada pela reportagem, mas até o fechamento dessa matéria não deu retorno.
Risco é menor, mas catadores estão sujeitos a acidentes na UTR
Apesar de correrem menos riscos ao trabalhar na UTR (Usina de Triagem de Recicláveis) os catadores do lixão ainda estão vulneráveis a sofrerem acidentes na unidade por não estarem devidamente capacitados. É o que afirma a Solurb, empresa responsável pela usina e coleta de lixo em Campo Grande, que ainda esclareceu que os coletores de recicláveis foram impedidos de trabalhar no local por não integrarem nenhuma das quatro cooperativas que atuam na UTR.
Segundo a empresa, “todos os catadores tiveram tempo suficiente para se cooperativar”. A exigência foi feita pelo MPT (Ministério Público do Trabalho) em novembro de 2015, quando ficou acordado que o lixão ficaria aberto até o dia 28 de fevereiro deste ano e neste período os catadores iriam se qualificar e ingressar em uma cooperativa, fato que não ocorreu – a UTR tem vaga para 420 trabalhadores, mas até o fechamento do lixão somente 88 atuavam no local. “Um novo acordo prevê que eles vão reativar a Coopersol, criada por eles em 2012 e assim, iremos realizar uma nova reunião”, garantiu a empresa por meio de nota.
Outra exigência para liberar a entrada dos catadores é de que os que não são capacitados no curso de cooperativismo promovido pela Funsat (Fundação Social do Trabalho) assumam o compromisso de se matricularem.
‘No lixão, existe risco de morte’, afirma procurador
Para o procurador do MPT, Paulo Douglas Almeida de Moraes, a transferência dos coletores do lixão para a usina não é o ideal, por não terem se capacitado antes de começar a trabalhar, contudo, a condição oferece menos risco do que se eles estivessem atuando ainda na área de transição. “É claro que o curso poderia lhes dar a noção de como o cooperativismo funciona e assim otimizar o trabalho, porém a UTR oferece mais segurança. No lixão, por exemplo, existe o histórico de morte, uma no chorume e a outra por soterramento, riscos que nenhum catador irá ter na usina”, explicou.
Outro benefício deles estarem na UTR é pelo fator controle. “Assim fica muito mais fácil cobrar esse curso”, afirma.
Conforme o catador Rodrigo Leão, o Carioca, a Coopersol já foi reativa e os trabalhadores estão se cadastrando, entretanto, ainda não há como saber o número de pessoas que farão parte do grupo, pois muitos cuidam da questão da mudança de seus barracos da Cidades de Deus, que começou a ser transferida de local nesta semana. “Só temos medo de nos cooperar e mesmo assim o acordo não ser cumprido”, disse, temendo ficar de fora da UTR hoje.
(Fonte: O Estado Online)
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