Deve ser algum recorde olímpico. Na manhã desta quarta-feira, exatamente 12 dias após desencadear a primeira operação que prendeu um cambista com mais de 800 ingressos em um hotel no Rio de Janeiro, a Polícia Civil acredita ter desmantelado parte de uma rede internacional da máfia dos ingressos que atua em grandes eventos. Pouco depois das 6h, os agentes entraram no quarto 813 do luxuoso Hotel Windsor Marapendi, na Barra da Tijuca. Ali dormia o homem que, de acordo com as investigações, seria o cabeça do grupo: Patrick Joseph Hickey, de 71 anos, membro do Comitê Executivo do Comitê Olímpico Internacional (COI) e presidente do Conselho Olímpico da Irlanda. O dirigente jogou sua credencial olímpica debaixo da porta e fugiu. Mas acabou capturado no quarto ao lado, 815, onde seu filho estava hospedado até semana passada. No momento da prisão, o cartola passou mal e teve de ser atendido por médicos.
Uma das mais robustas provas obtidas pela polícia contra Hickey foi durante uma busca e apreensão feita há duas semanas. Entre os ingressos apreendidos havia bilhetes do próprio Conselho Olímpico da Irlanda. “Não eram apenas ingressos da empresa indicada pelo comitê irlandês, mas da própria entidade”, diz o delegado Ricardo Barbosa, que comanda a investigação.
No dia da cerimônia de abertura da Olimpíada, os agentes do Núcleo de Grandes Eventos já haviam prendido o também irlandês Kevin James Mallon, diretor da THG Sports. Dentro de um cofre, foram encontrados ingressos que eram negociados a até 25 000 reais. Alguns deles justamente em nome da entidade esportiva que controla o esporte do país, que apressou-de em dizer que a responsabilidade era da empresa Pro10, credenciada oficial para a revenda de bilhetes para os Jogos. Além do mandado de prisão de Hickey, a juíza Mariana Shu, do Juizado Especial do Torcedor e Grandes Eventos, expediu mandados de prisão para três diretores da Pro10.
O curioso é que, dias antes de as competições começaram, a mesma Pro10 (que também tem sede na Irlanda) solicitou ao Comitê Organizador Rio-2016 que os ingressos para o evento fossem entregues exatamente a Kevin James Mallon, sem dizer que ele seria ligado à THG, empresa que já havia sido flagrada no esquema de cambismo durante a Copa do Mundo de 2014. Na verdade, de acordo com os investigadores, a Pro10 é uma empresa fantasma criada para fazer o esquema funcionar. “O Conselho Irlandês tentou credenciar a THG para a venda de ingressos, mas como não conseguiu, e então, em abril de 2015, criou essa Pro10, que é uma empresa que não tem gabarito, foi criada por eles justamente para isso”, afirma o delegado Aloysio Falcão.
Além de Hickey, os outros mandados são contra Michael Glynn, Eamonn Collins e Ken Murray. Todos vão responder por formação de quadrilha, marketing de emboscada e facilitação ao cambismo.
Na semana passada, a Justiça já havia decretado a prisão de quatro envolvidos no esquema, inclusive o dono da THG, o inglês Marcus Evans, que também tem em seu império um time de futebol, o Ipswich Town, da Inglaterra. Os outros mandados são contra o irlandês David Patrick Gilmore, o inglês Martin Studd e o holandês Marten Van Aos. Nenhum deles está no Brasil.
Assunto antigo – Em 2012, o deputado federal Romário (PSB-RJ) comunicou ao presidente do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, Carlos Arthur Nuzman, sobre a possibilidade de irregularidades na comercialização dos direitos de venda de ingressos da Olimpíada. Romário utilizou o envolvimento do presidente do Comitê Olímpico da Irlanda, Patrick Hickey, em um escândalo de vendas de ingressos dos Jogos de Londres 2012 e de Inverno de Socci 2014 para levantar suspeitas em relação à comercialização dos tíquetes do evento no Rio.
“Um dos amigos do Sr. Nuzman no COI (Comitê Olímpico Internacional), pelo que me consta, é o Sr. Patrick Hickey, irlandês, membro da Diretoria Executiva da organização e do Comitê de Coordenação que acompanha a organização dos Jogos do Rio de Janeiro. Eu gostaria de saber se o Sr. Hickey costuma visitar o Rio para contribuir com os preparativos do evento, ou para sondar oportunidades de negócios para a sua família”, escreveu Romário, em seu site.
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