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Bolsonaro recebeu terceiro pacote de joias sauditas; veja o que se sabe sobre o caso

TCU havia determinado a entrega às autoridades dos dois primeiros conjuntos e de armas que o ex-presidente ganhou do governo da Arábia Saudita

29/03/2023 às 10h20
Por: Tribuna Popular Fonte: CNN
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Alan Santos/PR - Ex-presidente da República Jair Bolsonaro durante encontro Bilateral com o Principe Herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed Bin Salman
Alan Santos/PR - Ex-presidente da República Jair Bolsonaro durante encontro Bilateral com o Principe Herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed Bin Salman

A Arábia Saudita entregou ao governo brasileiro e a Jair Bolsonaro (PL) três pacotes com joias durante o mandato do ex-chefe de Estado, entre 2019 e 2022.


Nesta semana, foi noticiado que, durante a viagem do ex-presidente ao país do Oriente Médio em 2019, foi entregue um estojo com relógio, caneta, abotoaduras, pingentes e anel. A informação foi revelada pelo jornal “O Estado de S. Paulo” e confirmada por Gustavo Uribe, analista de Política CNN.


Segundo a defesa de Bolsonaro, “os bens foram devidamente registrados, catalogados e incluídos no acervo da Presidência da República”. Além disso, os representantes afirmaram que todo o acervo de presentes será submetido à auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) e que eles estão à disposição “para apresentação e depósito, caso necessário”.


Em 2021, o príncipe Mohammed bin Salman Al Saud entregou dois estojos com joias ao então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que representou Jair Bolsonaro em agenda no país.


Os objetos, porém, não foram declarados como presentes de Estado –o que os eximiria de ter de pagar taxa na chegada ao Brasil, além de os regularizar e dar a devida destinação. A Receita Federal impõe que todos os produtos com valor superior a 1.000 dólares sejam declarados na entrada ao país.


O ex-ministro de Minas e Energia e a equipe de assessores dele viajaram em voo comercial e chegaram ao aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, no dia 26 de outubro de 2021.


Um dos estojos, que estava com um dos assessores, que continha um colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamantes avaliados em R$ 16,5 milhões, foi localizado e apreendido pela Receita.


De acordo com o órgão, a incorporação ao patrimônio da União exige um pedido de autoridade competente, “com justificativa da necessidade e adequação da medida, como, por exemplo, a destinação de joias de valor cultural e histórico relevante a ser destinadas a museu”.


Em comunicado, foi dito que isso não aconteceu. “Não cabe incorporação de bem por interesse pessoal de quem quer que seja, apenas em caso de efetivo interesse público”, pontua.


A CNN questionou integrantes da equipe do governo Bolsonaro por que as joias não foram registradas antes de chegar ao Brasil. Interlocutores afirmaram que o assessor do Ministério de Minas e Energia deveria ter informado que se tratava de um presente do reino da Arábia Saudita para a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o então presidente.


No segundo estojo havia uma caneta, um anel, um relógio, um par de abotoaduras e uma espécie de terço islâmicos, em valores oficialmente não divulgados, mas que está avaliado em R$ 500 mil. Este foi listado no acervo pessoal do ex-presidente Jair Bolsonaro, conforme o próprio confirmou à CNN.


No dia 28 de outubro de 2021, o gabinete do ex-ministro de Minas e Energia informou ao Departamento Histórico da Presidência da República que estava com os presentes entregues pelo governo da Arábia Saudita. Porém, omitiu-se que outros itens do primeiro estojo foram apreendidos pela Receita Federal.


Após um ano, em 29 de novembro de 2022, o itens do segundo estojo foram entregues ao Gabinete Histórico da Presidência da República, conforme a CNN confirmou em reportagem. No mesmo dia, os objetos foram incorporados ao acervo privado de Bolsonaro.


Conforme noticiou Daniel Rittner, analista de Política e diretor editorial da CNN em Brasília, entre os dias 27 e 29 de dezembro de 2022, auditores fiscais da Receita Federal em São Paulo barraram uma suposta tentativa do então secretário Julio Cesar Vieira Gomes para liberar as joias apreendidas no aeroporto de Guarulhos (SP).


De acordo com relatos feitos à CNN por dois auditores da Receita que acompanharam diretamente o caso, Vieira Gomes tentou usar o Ato de Destinação de Mercadoria (ADM), que corresponde à conclusão do processo de transferência do direito de propriedade das mercadorias retidas pela alfândega.


O então secretário da Receita Federal, que assumiu esse cargo em dezembro de 2021, agiu dentro da legalidade. A lei garante a possibilidade formal de que o ato de incorporação final dos bens apreendidos –para leilão ou doação– seja feito pelo chefe máximo da autarquia em Brasília.


No entanto, segundo os auditores, isso é a exceção. A regra é que a decisão fique com as delegacias da Receita Federal ou com uma de suas dez superintendências regionais.


As duas fontes disseram à CNN que Vieira Gomes tentou “avocar para si” a prerrogativa de incorporar o conjunto de joias retidas em Guarulhos. Com isso, caberia exclusivamente a ele decidir pela liberação das peças avaliadas em R$ 16,5 milhões.


Contudo, os funcionários da Receita em São Paulo ignoraram o pedido de Vieira Gomes e não transferiram o processo para Brasília, segundo relatos.


No dia 31 de dezembro, o então secretário foi nomeado adido tributário e aduaneiro na Embaixada do Brasil em Paris.


A Polícia Federal (PF) abriu um inquérito para investigar os fatos dos dois primeiros pacotes de joias. Segundo o ministro Flávio Dino, da Justiça e Segurança Pública, o caso pode “configurar os crimes de descaminho, peculato e lavagem de dinheiro, entre outros possíveis delitos”.


A investigação está sob a responsabilidade da Superintendência da PF em São Paulo, já que a apreensão ocorreu em Guarulhos, na Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários.


Controladoria-Geral da União (CGU) também instaurou uma Investigação Preliminar Sumária (IPS) quanto ao caso. A IPS é procedimento investigativo de caráter preparatório e não punitivo.


A CGU ainda declarou que o processo é de caráter restrito e que as informações só podem se tornar públicas após “eventual arquivamento, publicação do TAC ou julgamento do PAD dela decorrente”.


Nesta terça-feira (28), a Comissão de Ética da Presidência da República também decidiu abrir uma investigação para apurar os fatos que envolvem a chegada dos dois estojos joias trazidas pela comitiva brasileira em 2021.


Estão entre os investigados o ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid, além de Marcos André Soeiro, ex-assessor de Albuquerque que tentou passar na Receita Federal com o estojo que foi apreendido.


Caberá à Comissão de Ética da Presidência da República analisar se houve algum comportamento profissional por parte dos então servidores públicos que desrespeita as normas previstas.


A pena é uma repreensão pública pela conduta de uma autoridade, uma espécie de mancha no currículo, mas que não a impede de exercer novos cargos públicos.


Em depoimento à Polícia Federal (PF) no dia 14 de março, o ex-ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque afirmou que as joias foram enviadas “sem direcionamento”.


Ele também ressaltou que entendeu que recebeu os pacotes na qualidade de representante do governo brasileiro e que, assim, a destinação seria para a administração federal, mas que não houve direcionamento no país do Oriente Médio para quem as joias deveriam ir.


Conforme antecipado por Iuri Pitta, analista de Política da CNN, Albuquerque pretendia dizer que a resposta dele aos servidores da Receita Federal de que as joias seriam para a então primeira-dama Michelle Bolsonaro foi feita “no momento”, pois também teria sido pego de surpresa com o conteúdo dos pacotes.


A alegação é que nem ele, nem seu assessor teriam conhecimento de que os presentes se tratavam de joias. Disse ainda que assinou um termo em árabe relatando o recebimento de dois volumes lacrados; que perguntou ao mensageiro saudita do que se tratava e este respondeu que era apenas o entregador, não sabia.


À PF, o ex-ministro disse que citou a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro como destinatária das joias como dedução, mas que sempre entendeu que o destino final seria o patrimônio público do Estado, não para uso pessoal.


Bento ainda afirmou que o pacote que estava com ele foi aberto no dia seguinte, em seu gabinete e na presença de outras duas pessoas –e que assim que constatou serem joias, mandou alocar em cofre e comunicar o acervo público da Presidência, o que foi feito.


A comitiva, ainda segundo o ex-ministro, havia viajado com malas de mão, e estava com dificuldade de alocar todos os presentes recebidos. Um pacote foi colocado na mala de Soeiro, então assessor de Bento, e o outro, que sabe-se ser o pacote de joias masculinas, o ex-ministro transportou em uma sacola de mão.


O Tribunal de Contas da União (TCU) havia decidido que o segundo estojo de joias, listado no acervo pessoal do ex-presidente Bolsonaro, deveria ser entregue às autoridades, assim como um par de armas que o ex-mandatário trouxe do exterior.


O estojo retido pela Receita Federal também deveria ser encaminhado pela Receita Federal à Caixa Econômica Federal. Isso aconteceu no dia 24 de março.


As armas, um fuzil calibre 5,56 mm e uma pistola 9 mm que podem custar até R$ 57 mil, deveriam ser entregues à Polícia Federal, o que foi concretizado também no dia 24 de março.


Além disso, foi determinada vistoria completa em todos os presentes que Jair Bolsonaro recebeu durante seu mandato.


O ex-presidente havia dito sobre o conjunto que adicionou ao seu acervo pessoal que “não teve nenhuma ilegalidade. Segui a lei, como sempre fiz”.


Ao ser questionado sobre os outros presentes enviados também em 2021 pelo príncipe Mohammed bin Salman Al Saud e que foram retidos na Receita Federal, Jair Bolsonaro voltou a negar que tivesse conhecimento.


O decreto 4.344/2002, que trata sobre preservação, organização e proteção dos acervos documentais privados dos presidentes da República, diz no Art. 9 que todos os presentes dados em viagens devem ser encaminhados ao Departamento de Documentação Histórica do Gabinete Pessoal do Presidente da República.


Esse departamento é o responsável por analisar quanto à incorporação de presentes ao acervo privado do presidente da República ou ao acervo público da presidência da República.


Um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) de 2016, no entanto, determinou à Secretaria de Administração da Presidência da República e ao Gabinete Pessoal do Presidente da República que se incorporassem todos os objetos, mas que excluíssem os itens de natureza personalíssima ou de consumo próprio.


*publicado por Tiago Tortella, da CNN


*com informações de Elijonas Maia, Daniela Lima, Iuri Pitta, Lucas Rocha, André Rigue, Teo Cury, Tainá Falcão, Larissa Rodrigues, Isabela Filardi, Daniel Rittner, Leandro Magalhães, Carolina Farias, da CNN


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