Preso na quinta-feira (15) por posse irregular de arma de fogo ao ser alvo da Operação Cascalhos de Areia, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), Adir Paulino Fernandes, de 65 anos, identificou-se para a polícia como homem que sabe ler e escrever, mas que estudou somente até o 8º ano do Ensino Fundamental. Disse que trabalha com a venda de queijos e outros itens produzidos na chácara onde mora, a 3 km de Terenos – cidade a 25 km de Campo Grande. É de se admirar, contudo, que ele é “dono” de contratos que somam R$ 224.767.711,66 com a Prefeitura de Campo Grande.
Adir Paulino aparece em sistema de buscas de CNPJs (Cadastros Nacional de Pessoa Jurídica) da Receita Federal como único proprietário da JR Comércio e Serviços Ltda, classificada como microempresa, com capital social de R$ 500 mil, aberta em julho de 2011. Ainda conforme declarado à Receita, a Comercial JR (nome fantasia) tem como principal atividade a execução de obras de urbanização (ruas, praças e calçadas). Está, porém, habilitada a desenvolver outras 20 atividades.
Em 2017, a Prefeitura de Campo Grande contratou a empresa pela primeira vez para a “locação de máquinas pesadas, caminhões, veículos leves e equipamentos, incluindo o fornecimento de combustível, operadores, motoristas, alimentação, traslado, manutenção de todo o maquinário e demais custos”, de acordo com o divulgado no Portal da Transparência mantido pela administração municipal.
O contrato com a Sisep (Secretaria Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos), que já era milionário teve o valor, que havia sido acordado há seis anos, multiplicado em 6 vezes – ou melhor, foi aditivado em exatamente 534,73%. Em números absolutos, era de R$ 34.618.680,00, recebeu R$ 185.119.668,88 em aditivos ao longo dos anos e agora, vale R$ 219.738.348,88. Ainda conforme detalhado no Portal da Transparência, até agora, a prefeitura já depositou R$ 76.379.346,88 pelos serviços contratados e “executados” pela JR Comércio e Serviços.
A empresa tem outros três contratos com a gestão municipal, todos para a locação de veículos e caminhões. São mais R$ 5.029.362,78 contratados, dos quais, de 2018 até agora, R$ 4.151.660,17 foram pagos.
Assinatura - Apesar de informar em depoimento na Delegacia de Polícia de Terenos que possui renda mensal de cerca de R$ 2,5 mil, Adir Paulino Fernandes é quem pactua as prestações de serviço com a prefeitura e assina também vários aditivos, conforme publicações no Diário Oficial de Campo Grande.
A JR Comércio e Serviços presta serviços também para a secretarias de Assistência Social, Educação e Saúde. Só esse ano, teve três contratos aditivados, ou para a Comercial JR continuar como fornecedora por mais tempo ou para reajuste de valores.
Prisão – Tanto Fernandes quanto a sede da empresa eram alvos de mandados de busca e apreensão expedidos a pedido do Gaeco para a deflagração da Operação Cascalhos de Areia. Na quinta-feira (15), a força-tarefa saiu às ruas de Mato Grosso do Sul em busca de provas contra esquema de corrupção e desvios milionários.
O dono da Chácara Santa Dirce acabou preso porque, conforme boletim de ocorrência, policiais do Batalhão de Choque que vasculhavam a propriedade rural encontraram, debaixo da cama de um dos quartos, uma arma de fogo calibre 32 com duas munições intactas e duas deflagradas.
No interrogatório, acompanhado por advogado, ele disse que a arma pertencia ao pai que faleceu aos 92 anos e acredita que o revólver tenha mais de 100 anos, pois desde criança sabia da existência dele. Ressaltou ainda que nunca havia usado a arma e se soubesse que poderia “dar problema” já teria se livrado dela.
Outro lado - A reportagem tentou contato com Adir Paulino pelo número que ele deixou registrado no auto de prisão em flagrante, mas a linha cai direto na caixa postal.
O advogado que o acompanhou na delegacia, Paulo Ernesto Valli, informou que representa Fernandes apenas na investigação e futura ação penal pela posse irregular de arma. Ainda não tem conhecimento sobre o teor das acusações do Gaeco e só poderá responder pelo cliente quanto as suspeita levantadas pela operação se for contratado para atua nesta seara.
Esquema investigado – A denúncia que motivou as investigações preliminares fala em contratações “de fachada” para cascalhar ruas da cidade sem asfalto e serviços não são executados. O Gaeco suspeita que os valores previstos para as obras eram usados, na verdade, para a compra de imóveis para o ex-prefeito Marquinhos Trad e sua família.
A investigação apura crimes de peculato, corrupção, fraude à licitação e lavagem de dinheiro, relativos a contratos para manutenção de vias não pavimentadas e locação de maquinário de veículos na Capital. Os alvos foram as empresa, empreiteiros e servidores públicos.
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