Ex-servidor do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul e três empresários da Cirumed Comércio Ltda foram denunciados em ação de improbidade administrativa por fraudarem notas fiscais e desviarem, entre 2016 e 2019, R$ 12.014.362,10 em recursos destinados à unidade hospitalar, que atende pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Rehder Batista dos Santos, ex-coordenador de logística e suprimentos e ex-diretor administrativo e financeiro do HRMS, juntamente a Aurélio Nogueira Costa, Clarice Alovisi Costa e Claudenir Donizete Comisso, da Cirumed, foram denunciados pela 29ª Promotoria de Justiça que em investigação identificou as fraudes. O grupo foi alvo, em 7 de dezembro do ano passado, da Operação Parasita, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado).
Conforme a ação, no período de três anos, entre 1º de setembro de 2016 a 31 de outubro de 2019, a Cirumed, com aval de Rehder dentro do hospital, “emitiu 45 notas fiscais simuladas, inserindo declarações inverídicas, aduzindo falsamente a venda de produtos hospitalares ao Hospital Regional de Mato Grosso do Sul”.
O esquema era o seguinte: pedido de medicamentos ou insumos eram feitos junto à empresa que prestava serviço ao hospital, registrava-se isso no sistema interno, de forma virtual, mas os produtos nunca chegavam. Posteriormente, era dado baixa a esses itens, como se tivessem sido entregues ou emprestados de volta à Cirumed e, então, emitia-se nota fiscal, o que garantia o pagamento ao fornecedor.
Essa baixa era feita mediante a transferência fictícia dos produtos médicos para local inexistente ou que não era destinatário do produto; ou mediante a anotação falsa de remessa a setores do hospital que não utilizavam e/ou não recebiam os produtos; ou mediante a transferência, a título de “empréstimo”, para a própria fornecedora Cirumed; ou ainda simplesmente este estoque virtual era “zerado”, atribuindo-se o código de contagem/produto não localizado”.
A ação de encaminhar de forma mentirosa itens a setores do Regional afetou de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) a hemodiálise e Centro Cirúrgico.
Em um dos casos, em dezembro de 2017, foi emitida nota fiscal n. 43.593 sobre a venda de 3,3 mil unidades de “creme branco, viscoso, água, ureia (carmabida)” e 600 (seiscentas) unidades “hidrogel com poliaminopropil biguanida” e que foi devidamente paga em ordem bancária. Isso, decorrente de falsa movimentação interna de entrada e saída desse itens do hospital.
O MP sabe que não houve a tramitação real dos produtos porque houve diligência in loco nos setores que receberiam esses materiais e constatou-se que não houve qualquer entrada deles e nem mesmo solicitação direta ao almoxarifado.
Cita a ação que “o Hospital Regional também, por meio de sua Farmácia Central (CAFH), destacou que estes produtos jamais deram entrada naquele hospital público, e muito menos foram destinados ao uso dos pacientes”.
Em outro caso, em junho de 2018, a fraude foi sobre aquisição de 1,2 mil bolsas de colostomia. Naquele mês, foi registrado o ingresso do produto no hospital e, em seguida, Rehder ou algum servidora, a mando dele, atestou falsamente no sistema o recebimento do material. Depois disso, conforme a denúncia, foram realizadas movimentações indevidas no sistema de informática, a fim de ocultar a não entrega dos produtos.
Salta aos olhos o fato do quantitativo em excesso dos produtos. No caso das bolsas, por exemplo, houve falso movimento de saída de 400 para a clínica cirúrgica; 150 para centro cirúrgico; 150 para cardiologia; 450 para clínica médica; e 300 para CTI Adulto – ilha 2. Isso, com a finalidade de baixar o saldo no estoque virtual.
A quantidade muito acima do usual foi declarada em depoimentos de testemunhas ao promotor Adriano Lobo, da 29ª Promotoria. Uma delas disse que o uso desse produto na rotina hospitalar gira em torno de 20 unidades mês e seu estoque é de cerca de 6 unidades. Outra servidora do CTI Adulto contou que jamais recebeu 300 unidades e que a média de uso no setor é de no máximo duas bolsas ao dia.
“Constatou-se que as quantidades supostamente adquiridas são excessivamente elevadas e desproporcionais ao uso regular do HRMS, conforme detalhado no Relatório Conclusivo n. 02/2022”, cita a denúncia.
Os números exorbitantes indignam principalmente porque, conforme os relatos, a realidade é na verdade de escassez ou mesmo falta de vários produtos ou medicamentos, prejudicando o atendimento aos pacientes.
Com isso, o Ministério Público pediu a indisponibilidade dos bens dos investigados, que ainda não são réus nesta ação, até o valor total desviado entre 2016 e 2019; a perda da função pública; a suspensão dos direitos políticos por até 12 anos; pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano; e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais.
A reportagem entrou em contato com a Cirumed pelo telefone e a proprietária Clarisse disse que apenas o advogado da empresa poderia comentar algo, mas que ele estaria viajando e disse que haveria retorno posteriormente. Rehder também foi contatado, mas não houve resposta até o fechamento deste material.
Mín. 23° Máx. 39°