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Afastado pelo STJ, juiz comprou apartamento de luxo, avião e fazenda de R$ 30 milhões, diz PF

O magistrado tinha o hábito de sacar de R$ 100 mil a R$ 200 mil em espécie e declarar à Receita Federal valores muito abaixo dos efetivamente pagos

11/11/2024 às 08h08
Por: Tribuna Popular Fonte: O Jacaré
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Operação Ultima Ratio: juiz declarou ter pago R$ 700 mil em fazenda que pode valer entre R$ 30 milhões e R$ 70 milhões, segundo a PF (Foto: Arquivo)
Operação Ultima Ratio: juiz declarou ter pago R$ 700 mil em fazenda que pode valer entre R$ 30 milhões e R$ 70 milhões, segundo a PF (Foto: Arquivo)

Investigado por venda de sentença na Operação Ultima Ratio e afastado do cargo pelo Superior Tribunal de Justiça, o juiz Paulo Afonso de Oliveira comprou apartamento de luxo, avião e uma fazenda avaliada, no mínimo, em R$ 30 milhões, segundo a Polícia Federal. 

A investigação da PF mostra que Oliveira era amigo e até dividiu conta bancária por três anos com o juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, um dos poucos condenados administrativamente por corrupção pelo Tribunal de Justiça. Ele é marido da advogada Emmanuelle Alves Ferreira da Silva, que usou documentos falsos para dar golpe de R$ 5,5 milhões em um aposentado do Rio de Janeiro com a “ajuda” de Paulo Afonso de Oliveira. O magistrado liberou o saque da fortuna.

No relatório encaminhado ao ministro Francisco Falcão, do STJ, a PF esmiuça nos mínimos detalhes como ocorreu o golpe no engenheiro aposentado de Petrópolis (RJ) e como a Justiça age rápido quando há interesses escusos no processo.

Emmanuelle Alves levou um ano e meio para ingressar com a ação e colocar as mãos na fortuna do aposentado carioca. Enquanto cidadãos esperam décadas por um resultado ou pela condenação de envolvidos em escândalos de corrupção na Justiça sul-mato-grossense, o golpe, que teria contado com o aval de Paulo Afonso de Oliveira e do desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso, consumou-se em entre dezembro de 2016 e maio de 20218.

Com o uso de uma nota promissória falsa, um fazendeiro fictício e assinatura falsa, a advogada conseguiu sacar R$ 5.507.310,25 das contas do aposentado carioca. Apesar de ter sido alertado de que se tratava de um crime, Paulo Afonso não exigiu exames grafotécnicos e dificultou ao máximo a situação para o aposentado, como só analisar o recurso após o pagamento de R$ 16,2 mil de custas judiciais, mesmo o aposentado alegando ter renda de R$ 3 mil por mês.

Aldo Ferreira da Silva Júnior e Paulo Afonso dividiram conta corrente por três anos (Foto: Arquivo)

Segundo a Polícia Federal, Oliveira chegou a pedir ao banco que provisionasse o saque de R$ 100 mil dois dias antes de receber o dinheiro. Ele fez o pedido quando só contava com R$ 39 mil na conta. O depósito dos R$ 100 mil ocorreu logo após ele autorizar a advogada Emmanuelle Alves a sacar os R$ 5,5 milhões.

A quebra de sigilo bancário do magistrado mostrou que ele realizou pelo menos mais dois saques em dinheiro, de R$ 200 mil em maio de 2017 e R$ 180 mil em junho daquele mesmo ano.

Na época do golpe, logo após Emmanuelle Alves ser presa pelo Gaeco, Paulo Afonso de Oliveira concedeu entrevista coletiva e negou qualquer participação no golpe. De acordo com a PF, ele era amigo de Aldo Ferreira, marido da advogada. Os dois inclusive dividiram a titularidade de uma conta bancária no Banco do Brasil entre 2003 e 2006.

Vida de milionário

Na magistratura há 24 anos e sete meses, Paulo Afonso declarou salário mensal médio de R$ 69,8 mil entre 2016 e 2019, de acordo com a quebra do sigilo fiscal. Com rendimentos totais de R$ 3,3 milhões no período, ele ainda declarou rendimentos de R$ 688,7 mil com a atividade agropecuária.

A movimentação bancária do magistrado tem indícios de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. Ele declarou ter pago R$ 580 mil em um apartamento do Edifício Grand Tower, em  Campo Grande, em 2017. No ano seguinte, ele elevou o valor do imóvel para R$ 680 mil na declaração do IR.

A investigação chegou ao contrato firmado pelo juiz e a dona do apartamento, no qual o valor declarado era maior, R$ 943,5 mil.

Cinco anos depois, no ano passado, o juiz fez proposta para comprar a Fazenda Nova Guaporé, em Bodoquena, por R$ 18 milhões. Parte do pagamento seria em espécie. O apartamento entraria no negócio pelo valor de R$ 2,250 milhões – valorização de 230% em cinco anos.

“Outrossim, além de chamar a atenção as divergências de valores declarados, inclusive com valores abaixo do valor base do ITBI/ITCD, causa estranheza a suposta valorização do referido imóvel, tendo em vista que, após ter sido declarado por R$ 680 mil em 2018, seria oferecido em 2023 (período de 5 anos) no valor de R$ 2,5 milhões, o equivalente a mais de 3,6 vezes o valor inicialmente declarado”, pontuam os federais.

Oliveira propõe ainda dar outro apartamento no Living Parque dos Poderes no valor de R$ 700 mil. O pagamento em espécie teve duas propostas. Na primeira seriam R$ 3,2 milhões, sendo entrada de R$ 1,3 milhão e duas de R$ 950 mil. Ou seriam R$ 2 milhões em dinheiro vivo na primeira e o restante, R$ 1 milhão, na segunda parcela. O relatório não informa se o magistrado concluiu o negócio.

Juiz comprou apartamento por R$ 580 mil em 2018 e queria colocá-lo pelo valor de R$ 2,2 milhões em negócio por fazenda de R$ 18 milhões (Foto: Arquivo)

Avião e fazenda de R$ 30 milhões

Paulo Afonso de Oliveira comprou 50% de avião Cessna 182 e informou ter pago R$ 100 mil. A PF estima que a aeronave custe, no mínimo, quase quatro vezes mais. O avião está avaliado entre R$ 750 mil e R$ 1,3 milhão. A declaração do IR trouxe um valor muito abaixo do mercado.

O magistrado informou que comprou a Fazenda Recanto da Serra, com 1.030 hectares, em Miranda. Ele informou à Receita Federal ter pago R$ 700 mil na área em 27 de maio de 2008. A propriedade com 1.679 bovinos. Só os semoventes estariam avaliados em mais de R$ 5 milhões.

A PF estima que o valor de mercado da fazenda seria de, no mínimo, R$ 30 milhões. O valor pode chegar a R$ 70 milhões.

“Em que pese terem se passado 15 anos, a diferença de R$ 700 mil para R$ 30 milhões em tal período aponta novamente, a nosso ver, que PAULO AFONSO declarou valor de aquisição de tal fazenda abaixo do real para ocultar a origem dos recursos utilizados, podendo ter natureza ilícita”, concluíram os investigadores.

Transações suspeitas

A PF descobriu vários pagamentos em espécie feitos pelo juiz que não tiveram a origem definida. Houve compra de R$ 17 mil em uma empresa de alimento para animais sem que houvesse saque da quantia em qualquer conta bancária do magistrado.

Entre 2017 e 2023, o magistrado teria feito depósitos para U.E.R., que é funcionário de uma das propriedades rurais do magistrado e ao mesmo tempo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Neste período, Paulo Afonso pagou R$ 266 mil em 119 transações para o funcionário.

“Ademais, não foram identificados saques das contas de PAULOAFONSO que pudessem indicar relação com os depósitos em espécie supramencionados, desse modo, resta a dúvida da origem dos numerários por ele depositados, que estariam sendo utilizados, ao que tudo indica, para o desempenho de suas atividades rurais”, suspeita a PF.

“Durante a análise dos materiais, foi possível identificar fortes indícios de que PAULO AFONSO DE OLIVEIRA (CPF 501.159.441-68) realize, de modo frequente, transações de elevados valores em espécie”, destacou.

O Frizello Frigorífico repassou R$ 703,83 mil entre 2017 e 2018 para a conta bancária do magistrado. A empresa pertence ao empresário José Carlos Lopes, o Zeca Lopes, denunciado por pagar propina para o juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior e alvo de operações da Polícia Federal e do Gaeco.

Operação Ultima Ratio

Paulo Afonso de Oliveira foi afastado da 2ª Vara Cível de  Campo Grande na Operação Ultima Ratio, que afastou também os desembargadores Sérgio Fernandes Martins, SIdeni Soncini Pimentel, Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Bastos e Marcos José de Brito Rodrigues.

O escândalo é um dos maiores da Justiça estadual. Os desembargadores passaram ser monitorados por tornozeleira eletrônica e só colocaram o adereço após 12 dias.

PF comanda a maior operação contra venda de sentença na história da Justiça estadual (Foto: Arquivo)
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