O Gecoc (Grupo Especial de Combate à Corrupção) concluiu análise de dados extraídos de aparelhos apreendidos na Operação Laços Ocultos, que reforçam esquema que desviou milhões dos cofres públicos de Amambai, cidade a 359 km de Campo Grande.
Conforme relatório obtido pelo Jornal Midiamax, as investigações apontam que o ex-vice-prefeito — e ex-vereador — Valter Brito da Silva (PSDB) seria o líder da organização criminosa, que contava com participação da filha, empresários e servidores. Somente o político teria recebido cerca de R$ 5 milhões em propina.
A conclusão do relatório apresentado nesta semana à Justiça aponta que “os elementos reunidos confirmam a existência de um intricado esquema de conluio entre empresários e servidores públicos, com o objetivo de fraudar licitações públicas, sob o comando de Valter Brito da Silva”.
Então, os investigadores selecionam diversos trechos de conversas para serem usados como provas na ação penal contra o grupo.
Um dos trechos extraídos de aparelhos dos acusados mostra áudio enviado por Everton Roque da Silva Maurício, genro de Valter, em que ele diz à esposa — e filha do político —, Fernanda Carvalho Brito: “Quem
tem que ter orgulho é teu pai. De todo mundo. Que quase se mata trabalhando pra ele ganhar dinheiro”.
Também, ficou evidenciado, para o Gecoc, que Valter ajudava na elaboração dos certames, com objetivo de fraudar para direcionar a empresas selecionadas, que haviam pagado propina.
Em conversa com um servidor público, Valter questiona se ele já teria montado a composição de preços de
uma obra, por exemplo.
Também foi extraída conversa em que Jonathan Fraga de Lima, da JFL Construtora, envia comprovante de transferência de R$ 2,5 mil para a conta de pessoa física do servidor Maurício Sartoretto, “indicando que tal valor era vantagem indevida”, diz o relatório.
Em outro diálogo, empresário que tinha pendência que impedia contratação de sua empresa sugere utilizar empresa ‘do Brito’. Depois, o próprio Valter encaminha dados da J&A Construtora, registrada em nome de Joice Mara Estigarriba — delatora do esquema. “Novamente, demonstra a atuação do agente público
Valter em prol do grupo de empresários beneficiados com as contratações públicas”, aponta o Gecoc.
Em outro trecho, os investigadores extraem conversas reforçando a atuação de Valter nas licitações, em que Maikol do Nascimento Brito, da empresa MMA Engenharia, questiona Letícia “se ela iria participar de determinada licitação, dizendo que seria apenas necessário mostrar a documentação e que as propostas já estariam prontas, compartilhando ainda captura de tela de conversa com Valter Brito a respeito do esquema”.
O relatório traz ainda alguns trechos de conversas que demonstram a preocupação dos acusados em serem pegos. Assim, Valter teria comentado com Maikol sobre a empresa ConsBR não ter certidão para participar de licitação, dizendo que ganharia com a dele, e encerra a conversa dizendo que “não se fala mais isso em celular”.
Em outra conversa, Valter e seu filho Lucas comentam sobre a empresa de Joice, a J&A Construtora, que estariam trabalhando para ela ganhar uma licitação. Então, Lucas revela que estaria montando propostas de outras empresas para manipular o resultado do certame. Em dado momento, Lucas questiona: “Pego a
do brito?”, “Aguia?”, “Ts?”. No final, Valdir ainda faz um comentário: “Cuidado com
mensagem, o bicho ta [sic] pegando”, o que demonstra a ciência da ilicitude do esquema.
Por fim, os investigadores concluem: “É possível afirmar que os elementos coletados apontam para a existência de uma organização estruturada, com divisão de tarefas e atuação coordenada entre agentes públicos e empresários, voltada à fraude de procedimentos licitatórios e corrupção ativa e passiva, sob o comando de Valter Brito da Silva”.
Após a Operação Laços Ocultos, com a apreensão dos celulares dos investigados, foi possível identificar conversas entre os acusados. Em vários trechos, eles negociam as licitações, para ‘amarrar’ os pregões.
O Gecoc denunciou a ligação entre todas as empresas, incluindo transações bancárias de altos valores entre esses empreendimentos. Então, em determinado trecho da denúncia, os promotores apontam que Jonathan Fraga de Lima e Letícia de Carvalho, responsáveis pela empresa JFL, pagaram altos valores de propina para Valter.
Em 58 ocasiões, pagaram o total de R$ 708.680,00 e R$ 118.800,00 para Jucélia, como propina. O dinheiro da empresa tinha como principal fonte a Prefeitura de Amambai. Só entre setembro de 2019 e dezembro de 2021, a empresa recebeu R$ 11.849.735,18 em contratos.
Por meio de outra empresa, a Transmaq Serviços e Locações Eireli, Jonathan e Letícia chegaram a repassar R$ 4.185.883,77 para Valter, conforme indicam as movimentações bancárias.
A denúncia ainda traz valores repassados de todas as empresas implicadas na denúncia para o vereador. Preso, Valter nem sequer citou a função parlamentar na audiência de custódia.
Quando questionado a respeito de sua ocupação, respondeu: “Ah, eu hoje sou, na verdade eu sou prestador de serviços, né. Mas eu não tenho, assim, eu sou motorista, trabalho cuidando de obra, é isso que eu faço hoje”.
O vereador se tornou réu pelos crimes de organização criminosa, fraude ao caráter competitivo de licitação pública por 33 vezes, corrupção ativa e corrupção passiva por 7 vezes, além de concurso material de crimes.
Por fim, outros 16 investigados, sendo empresários e familiares de Valter, além da servidora Jucélia, também se tornaram réus.
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