Terça, 16 de Setembro de 2025
24°C 41°C
Jardim, MS
Publicidade

Indústrias ecológicas lutam contra barreiras

20/10/2016 às 11h57
Por: Tribuna Popular
Compartilhe:
 -
-

As telhas amassam, mas não quebram -- elas são feitas de papelão. As máquinas fazem tijolos sem agredir o meio ambiente -- a matéria prima é areia e não é preciso colocá-los em fornos como os convencionais. Os móveis belos e fortes são fabricados sem que uma árvore sequer seja derrubada -- as peças são feitas com madeira de demolição.

A produção citada acima é de indústrias de Campo Grande que optaram por fabricar produtos ecologicamente corretos. Apelidadas de indústrias ecológicas estas empresas, avançadas no quesito sustentabilidade, não são exatamente novidades na praça. A fabricação de telhas ecológicas, por exemplo, tem quase 20 anos na Capital. Contudo, a aceitação leva tempo. Indústrias desse tipo ainda lutam contra barreiras culturais para ganhar mercado.

Dentro do galpão de produção da Tecolit Indústria de Telhas Ecológicas, a sensação térmica é a prova de que se está em um ambiente industrial diferenciado. O local foi coberto com as telhas ecológicas que deixam o interior mais fresco do que as convencionais, pois esquentam menos.

Elas são fabricadas com papelão e vários tipos de papéis. A mistura dos materiais é feita em uma máquina, uma espécie de liquidificador gigante, onde se acrescenta água e aditivos cujos componentes não são detalhados para preservar o segredo industrial, necessário em qualquer negócio. Quando está no ponto, a massa sobe pela esteira e termina no cilindro, de  onde os operários da fábrica retiram as mantas.

Em seguida, elas são colocadas nas formas e reservadas para secagem à luz do sol no pátio da indústria. "O aproveitamento da matéria prima é de 100%. Só perde mesmo a água que evapora", brinca o sócio-proprietário da Tecolit Renato Graeff. Mesmo a água utilizada na indústria é captada das chuvas. "Cerca de 70% do líquido utilizado é do nosso sistema de reaproveitamento da água da chuva", conta. Parte do papel utilizado é obtido junto a outras empresas que incentivam os funcionários à coleta seletiva e à reciclagem, assim a fábrica de telhas ecológicas participa de uma cadeia de sustentabilidade.

Após secarem e ganharem as ondulações nas formas, as mantas passam pelo sistema de impermeabilização. Elas são mergulhadas em uma massa de cimento asfáltico e ficam 'cozinhando' por cerca de 60 minutos em fornos de alta temperatura. Saídas do forno, é só deixar esfriar e as telhas estarão prontas. Uma telha padrão de 1m60 de comprimento pesa quatro quilos depois de finalizada.

Renato Graeff explica que os principais clientes do produto são do agronegócio. Produtores rurais usam as telhas ecológicas em galpões onde armazenam os grãos, atraídos especialmente pela sensação térmica diferenciada. No campo, o produto também é bastante utilizado em instalações para confinamento de animais, por exemplo.

No entanto, o empresário lamenta que o uso em residências ainda seja limitado. "Aí é que entra a questão cultural. Muitas vezes não se quer sair do convencional. As telhas fabricadas a partir de fibras vegetais recicláveis e betume asfáltico, além de serem um produto ecologicamente correto, proporcionam conforto térmico e são resistentes", defende.

Ele cita que o telhado do galpão da Tecolit tem 12 anos e permanece intacto, sem rachaduras ou goteiras. Além disso, não se tem perdas no transporte o que frequentemente ocorre com as convencionais que se quebram, obrigando empresas ou clientes a gastos extras.

O preço do produto também compensa, segundo o empresário. Na comparação com telhas de fibrocimento de 4mm, por exemplo, que é o material mais barato por metro quadrado ofertado no mercado, o valor das telhas ecológicas é igual ou ligeiramente mais barato. "Além disso, o nosso material é bastante superior nos vários aspectos que já mencionamos", enfatiza.

Com essa argumentação convincente, possível de se provar na prática, as telhas ecológicas têm ganhado clientes fora dos limites de Mato Grosso do Sul. A Tecolit já exportou para consumidores em Minas Gerais, estados da Região Nordeste e até Bolívia e Paraguai. Atualmente, a fábrica já produz  25 mil unidades ( telhas Tecolita Padrão 1,60 x 0,80m ) mensalmente e pode dobrar a produção com pequenas adaptações, conforme o proprietário.

Fábrica de tijolos - Na Ecomáquinas, as chapas de aço vindas de São Paulo, painéis, componentes eletrônicos, mangueiras, lonas e outros itens são transformados em fábricas de tijolos ecológicos, num processo semelhante a uma montagem de veículos em série, onde as peças se movem para receber as soldagens feitas pelos operários. A linha de produção da indústria não é aberta à imprensa, mas é possível visitar o setor onde são feitas as últimas soldas, ajustes finais e pinturas do maquinário.

A empresa está no mercado há cerca de 12 anos e mantém um cuidadoso processo de fabricação de máquinas, observando normas técnicas internacionais. O conjunto  de máquinas produzido forma o parque industrial no qual o comprador poderá fazer tijolos ecológicos. Conforme o fabricante, as máquinas são de grande robustez, só que compactas.

A indústria tem um espaço para experimentos no qual o visitante pode conferir os detalhes de funcionamento das máquinas e o passo a passo da fabricação dos tijolos. O kit industrial  completo é composto por peneiras, trituradores de solo, esteiras, misturadores, prensas e caixas modeladoras. O funcionamento do maquinário é simples. Dentro da máquina, a mistura de cimento, terra e água é prensada e moldada e o tijolo sai pronto. Os moldes podem ser trocados, permitindo a produção de vários tamanhos e modelos de tijolo.

As máquinas são feitas sob medida para a produção ambientalmente correta. O fabricante de tijolo ecológico não vai precisar de argila, cuja captação agride as nascentes e muito menos vai queimar o produto final, como num processo convencional. Com isso, evitará a derrubada de árvores e a emissão de gases na atmosfera.

A matéria prima principal é própria  areia. O cimento é utilizado na proporção oito para um e a água que pode ser reaproveitada das chuvas. A gerente de qualidade  da Ecomáquinas Vanessa Diniz explica que qualquer tipo de terra  pode ser utilizado. Até rejeitos da construção civil podem ser aproveitados, já que o parque industrial é preparado para moer e uniformizar o material que será usado.

"Após o processo de preparação da terra, mistura, prensa e molde, o tijolo que sai da máquina não será queimado, mas sim molhado com água de três a sete dias no processo de cura", detalha. O resultado final é um tijolo ecológico e mais resistente que os convencionais, segundo a gerente.

A ideia de ter uma fábrica de tijolos sem agredir o meio ambiente conquistou o construtor William Rufino, proprietário da Ecohabitare Construções, que há seis anos adquiriu o jogo completo de equipamentos da Ecomáquinas. Hoje chega a fabricar até 150 mil tijolos por mês dependendo da demanda para atender sua clientela.

"Além da questão ambiental, a casa feita com tijolos ecológicos proporciona melhor qualidade de vida aos moradores. Isso porque os furos ficam para cima de modo que o ar circula pelas paredes e a sensação térmica é melhor", argumenta  o empresário que além de fabricar tijolos também constrói casas sob medida e ecologicamente corretas.

Conforme Vanessa Diniz, a maior parte dos clientes chega à Ecomáquinas após ter tomado conhecimento da empresa pela internet. Ela defende que tanto o conjunto de máquinas quanto o processo de fabricação de tijolos tem custos acessíveis. O preço da usina completa é de, no máximo, R$ 180 mil. Já a matéria prima depende da localidade da fábrica. Na região de Campo Grande, por exemplo, a areia é abundante e, por isso, pode ser comprada a preços baixos.

A Ecomáquinas produz cerca de 20 fábricas de tijolos por mês e já exportou o produto para mais de 60 países, entre os quais Argentina, Venezuela, Equador, Estados Unidos, México, Guiné Bissau e Guiné Equatorial.

Arteiro - Na oficina da Arteiro Artesanatos, o proprietário Jefferson Rogério Gonçalves da Silva, 39 anos, é quem põe a mão na massa, ou melhor, na madeira. Ele transforma madeiras de demolição em móveis feitos artesanalmente. A maior parte da matéria prima, ele consegue pesquisando casas antigas em Campo Grande. "A cidade ainda tem muitos casarões da década de 50 edificados com uso de madeira nobre. Por vezes, as pessoas querem incinerar para fazer novas construções, sem imaginar o valor daquela madeira", relata.

Segundo ele, há casas construídas com peroba rosa, sua favorita na oficina, pelo tom rosado que garante belas peças. "É uma madeira em extinção, proibida de ser extraída", afirma mostrando um gabinete de madeira feito com a peroba rosa. As peças geralmente são encomendadas por clientes que desejam algo exclusivo e com durabilidade. "Tem muita gente que discorda do preço, o que se deve à falta de conhecimento. Um trabalho artesanal bem feito leva tempo. Além disso, é preciso observar a qualidade da peça. Eu faço  móveis caprichados nos detalhes, com encaixe correto, o que garante a firmeza e durabilidade da peça", valoriza.

Além de lutar diariamente contra a falta de esclarecimentos sobre a produção artesanal, Jefferson Rogério enfrenta outra barreira que impede o aumento da produção. "Não se consegue encontrar pessoas capacitadas para este tipo de serviço." Com isso, ele segue sozinho na oficina. Em cinco anos de dedicação à fabricação de peças de madeira e algumas de ferro, ele calcula já ter produzido mais de 500. "Uns chamam de arte, outros de artesanato. Não sei qual é o certo. Só sei que gosto de fazer", brinca.

Jefferson descobriu o talento para a fabricação de móveis em meio a uma crise profissional. Ele não estava satisfeito no paisagismo e decidiu inovar. Começou aos poucos a produção de peças e hoje tem uma oficina completa, com loja na frente. Outro detalhe é que ele fabrica as próprias ferramentas. Além do próprio talento inesperado, Jefferson descobriu também o da esposa Tatiana Donatti, de 35 anos.

Ele a inseriu na loja e viu surgir uma artesã de talento e boa comerciante. Tatiana decora peças  artesanais em gesso e exporta os produtos, especialmente as imagens sagradas como santos e anjos com pérolas e detalhes dourados. "Envio caixas dos produtos para clientes em Santa Catarina, São Paulo e Paraná, por exemplo. Eles veem as fotografias postadas nas redes sociais da internet e aí fazem os pedidos", revela a artesã.

As peças decoradas por Tatiana também estão à disposição na loja, assim como os móveis rústicos e ecologicamente corretos que saem da oficina de Jefferson, compondo o ambiente que é uma mistura do trabalho e do talento do casal.

Barreiras - O presidente do Conselho Temático Permanente de Meio Ambiente (Coema) da Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul (Fiems), Isaías Bernadini, acredita que  para vencer barreiras culturais em relação aos aspectos de sanidade, qualidade e padronização, é preciso conscientizar o público de que o produto ecológico não tem qualidade  inferior ao produzido com insumos convencionais.

Contudo, na opinião de Bernadini, a principal barreira que se apresenta é a de natureza econômica, o que leva o preço final a ser menos competitivo. "Alguns produtos ecológicos não se consolidam devido à logística de seus insumos diferenciados, fretes caros e tributação excessiva. Para se consolidar no mercado,  é necessário desonerar seus insumos, que, muitas vezes, são resíduos de outros processos produtivos conseguidos através de sistemas de logística reversa", explica.

Bernadini cobra apoio integral de um pacote de ações oficiais a nível de Estado e Município, principalmente, nos aspectos tributário, fiscal, financeiro e na qualificação da mão-de-obra envolvida no processo produtivo diferenciado.

Conforme o presidente do Coema, o número de empresas que se dedicam à fabricação de produtos ecologicamente corretos ainda é desconhecido. Atualmente, o Conselho mantém contato com os 24 sindicatos da indústria de  Mato Grosso do Sul no sentido de constituir o Cadastro Industrial em que esse número poderá ser conhecido.

Serviço:

Tecolit: Rua Senador Pompéu, 160, Campo Grande. Telefone: (67) 3344-5737

Ecomáquinas:  Rua Ada Teixeira dos Santos, 538 - Pólo Empresarial, Campo Grande. Telefone: (67) 3355-3005

Ecohabitare: Rua Rua Marechal Rondon, B. Nova Esperança, Rio Brilhante. Telefone: (67) 3452-2333

Arteiro Artesanatos: Rua 13 de Maio, 782, Centro Campo Grande. Telefone: (67) 3211-7961

Coema: Edifício Casa da Indústria - Av.Afonso Pena, 1206, Campo Grande. Telefone (67) 3389-9000

* O conteúdo de cada comentário é de responsabilidade de quem realizá-lo. Nos reservamos ao direito de reprovar ou eliminar comentários em desacordo com o propósito do site ou que contenham palavras ofensivas.
Jardim, MS
33°
Tempo nublado

Mín. 24° Máx. 41°

32° Sensação
0.82km/h Vento
27% Umidade
0% (0mm) Chance de chuva
06h39 Nascer do sol
18h39 Pôr do sol
Qua 42° 25°
Qui 43° 26°
Sex 44° 26°
Sáb 44° 26°
Dom 43° 28°
Atualizado às 11h04
Publicidade
Publicidade
Economia
Dólar
R$ 5,30 -0,37%
Euro
R$ 6,28 +0,31%
Peso Argentino
R$ 0,00 +0,00%
Bitcoin
R$ 648,767,07 +0,03%
Ibovespa
143,993,31 pts 0.31%
Publicidade
Publicidade
Publicidade