
Há políticos que acreditam que o tempo é capaz de apagar o passado, que o esquecimento público basta para varrer da memória coletiva as manchas deixadas pela corrupção. Um exemplo recente é o do ex-secretário de Obras e Infraestrutura de Mato Grosso do Sul, Edson Giroto, condenado novamente em um processo derivado da Operação Lama Asfáltica.
Conforme decisão do juiz Ariovaldo Nantes, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, ficou comprovado que o ex-agente público acumulou patrimônio incompatível com seus rendimentos entre 2007 e 2015. A sentença determinou a devolução de mais de dez milhões de reais, o pagamento de indenização por dano moral coletivo e a suspensão dos direitos políticos por doze anos.
É a história se repetindo. Giroto, que recentemente havia se filiado ao PL e se apresentado como pré-candidato a deputado federal, apostava na volta ao cenário político. Parecia crer que o tempo e a conveniência política bastariam para anestesiar o eleitorado. A nova condenação, porém, veio como uma ducha fria. Cantar vitória cedo demais, especialmente quando o passado ainda cobra, é o tipo de erro que costuma encerrar carreiras.
Recuperar direitos políticos não é o mesmo que recuperar credibilidade. O que foi visto nos últimos meses foi uma tentativa de retorno apoiada em antigas conexões partidárias e na crença de que o eleitor tem memória curta. Mas o passado político de Giroto continua associado à Lama Asfáltica, uma das maiores operações contra corrupção em Mato Grosso do Sul, deflagrada em 2015, que apontou fraudes em licitações, superfaturamento de obras e lavagem de dinheiro.
A investigação do Ministério Público Federal estimou, à época, um prejuízo de cerca de meio bilhão de reais aos cofres públicos. A denúncia envolveu contratos de pavimentação, propriedades rurais e até a compra de aeronaves. Ainda que nem todas as acusações tenham sido julgadas, a operação revelou um padrão de comportamento no qual a fronteira entre o público e o privado foi apagada.
Mesmo com o peso desse histórico, Giroto acreditou que poderia retomar a carreira política como se nada tivesse acontecido. A filiação ao PL, com direito a foto ao lado de Valdemar da Costa Neto, presidente nacional do partido, parecia uma tentativa de ressurgimento. A estratégia era simples: transformar o esquecimento em aliado. Mas a justiça, ainda que demore, costuma encontrar o momento certo para agir.
Há algo de simbólico na coincidência entre a reentrada política e a nova condenação. O retorno foi breve, quase um suspiro antes da sentença. A decisão judicial veio como uma última pá de cal sobre o projeto de poder que ele tentava reconstruir. Não se trata apenas de um revés jurídico, mas de um ponto final moral.
O episódio é uma lição sobre os riscos da soberba na política. Muitos acreditam que cargos e conexões são escudos contra o passado. Acreditam que o esquecimento é blindagem. Mas a memória social, por mais seletiva que seja, guarda o essencial: quem usou o poder para se beneficiar e quem pagou a conta.
Em idade avançada, Giroto encerra sua trajetória pública com o mesmo estigma que tentou enterrar. A nova condenação o retira, por muitos anos, da disputa eleitoral e o coloca novamente sob o peso da desconfiança popular. Não é apenas a queda de um político, mas o retrato de um sistema em que o apadrinhamento e o cálculo de poder valem mais do que a ética.
O caso também serve de lembrete à classe política. A tentativa de normalizar o retorno de nomes envolvidos em escândalos é uma das razões pelas quais a população mantém desconfiança generalizada em relação à política. A falta de autocrítica alimenta a sensação de impunidade e o ciclo se repete: quem caiu volta, quem voltou cai novamente.
O ditado sobre o telhado de vidro nunca foi tão apropriado. Se o seu telhado é de vidro, que seja pelo menos blindado. No entanto, Giroto preferiu exibi-lo ao sol, certo de que nada mais poderia atingi-lo. A ironia é que a própria luz que ele buscava acabou revelando as rachaduras que o tempo e a vaidade insistiam em esconder.
A política é um terreno ingrato para quem confunde popularidade com perdão. É também um campo onde o excesso de confiança costuma ser punido com o esquecimento. No fim, a trajetória de Giroto é um aviso a todos os que acreditam que a aparência de normalidade é suficiente para encobrir o passado. Não é. O eleitor pode até se calar por um tempo, mas a justiça e a história costumam falar por ele.
O retorno que parecia certo se transformou em um adeus inevitável. E a carreira que tentou renascer das cinzas terminou sepultada sob o peso das próprias contradições.
A última pá de cal sobre Edson Giroto é mais do que o fim de uma biografia política. É uma lembrança de que o poder, quando usado de forma errada, sempre cobra o preço da soberba.
Este artigo reflete a opinião do autor, com base em informações públicas disponíveis em decisões judiciais e reportagens jornalísticas sobre o caso citado. As interpretações aqui apresentadas têm caráter opinativo e não constituem afirmações de culpa além das decisões judiciais divulgadas pela imprensa.
Mín. 20° Máx. 27°